quarta-feira, janeiro 10, 2007

Multidão em perigo

Encontram-se aos magotes. Carcaças ocas no saco, especam em frente a montras de papelarias, quiosques... deitam o olho à capa de revistas, soletram lento as "gordas" da primeira página de jornais como quem acorda, sorvendo a vida de artistas, de profissionais do jet set e até, de personagens de telenovelas. Enquanto se esquecem da sua própria vida, comentam as atribulações, as traições, os amores não correspondidos, as contratações milionárias e as quedas em desgraça de ídolos queridos. Indignam-se com crimes de faca e alguidar e podem rejubilar com o nascimento da filha de uma qualquer princesa que em tempos lhes foi apresentada numa fotografia genialmente desfocada por um profissional de fofoca, que se desunha a trabalhar para lhes alimentar o espaço sem graça em que viram transformada a existência.
Procuram fazer passar o dia! Fazer coincidir a chegada a casa com o início de alegres programas televisivos em que a tombola luminosa e colorida gira, distribuindo produtos aos necessitados inscritos. E há cânticos bem ensaiados, palmas bem orquestradas, casacos às flores e vestidos bem decotados brilhantes, risos e gritinhos importados, a cada coelho tirado da cartola. Uma ou outra lágrima de comoção rola em faces sofridas, enfeitadas com sorrisos envergonhados, desdentados!
Para receber o prémio há que contar o drama e despertar a piedade de quem - lá, do outro lado do ecrãn -, vai fritando os panadinhos! Depois, é a alegria: Ao coxo é dada uma bengala, à mãe solteira desempregada, um fardo de fraldas e ainda... um esquentador inteligente, à ceguinha uns oculos escuros, à desdentada uma ponte, um dente... o programa na fase final, os panados já quase estaladiços, confetis no ar, a banda a tocar e aquela gente toda que se abraça, eternamente reconhecida a conhecidas empresas que aceitam o jogo de dar para melhorar a imagem e vender mais.
...Num canto, em que ninguém a vê, a assistência social mantêm-se na sombra de matraca fechada, os poderes instituídos alimentados pelos impostos dos desgraçados que passam a vida a fugir, a fingir... reservam-se o direito de deixar o mercado autorregular-se.
Do outro lado, cá ou lá, tanto faz - uma vez que tudo está misturado e provávelmente no seu lugar -, a D. Eduarda, chama Srº Joaquim para almoçar e apaga a televisão antes de começar o telejornal! É que eles, querem almoçar descansados!...

6 comentários:

Anónimo disse...

gostei do "uivo". excelente,como é teu timbre...

Kalinka disse...

SABIA QUE...?

Iniciou-se a contagem decrescente para o lançamento do livro
«Que é o Amor?».

Colaborei com um texto da minha autoria, dedicado a todos que de alguma forma marcaram a minha Vida em momentos inesquecíveis, mas também a alguém muito especial que nasceu dia 7 de Fevereiro e que, por não pertencer ao Mundo dos vivos, guardo com muito Amor, na minha memória (minha Mãe).

É uma excelente oferta em qualquer altura, mas como se aproxima o Dia dos Namorados, será bom começarem a preparar as vossas encomendas quanto antes.

Beijos e abraços.

Estás convidado a espreitar!!!

Kalinka disse...

Ah...esqueci-me de dizer que gostei do que li - bem retratada a vida de milhares de portugueses nas suas bem estruturadas frases do post. Parabéns.

uivomania disse...

Herético isto de uivar, já é mais desabafo que outra coisa. Abraço.

uivomania disse...

Kalinka, fica a nota. Estou curioso.

Anónimo disse...

um abraço