sábado, julho 09, 2005

Razões submersas

Sem saber como, foi dar com a imaginação a galope transpirando libido. Solta, ia dando corpo a saudades, dos seios aveludados em que em tempos repousara e se sentira, protegido. Seios, que acariciara sem culpa nem maldade... entregue ao puro gozo a que nesses tempos se permitia.
Sem saber porquê, deu por si constrangido, invadido por culpas sem lhes apanhar o sentido! Em conflito, à cautela, inibiu o impulso, contrariou o instinto e, reforçou a blindagem que lhe permitia viver em conformidade com a moral prevalecente como um homem de sucesso e, se bem que frustrado, ficou mais descansado, mais próximo da certeza de não ser um pervertido daqueles, que lhe habitavam o imaginário.
Protegido assim o Ego, couraçado, retirado dos dentes o freio à besta, partiu duro e frio, disposto a vender caro o seu desprazer, decidido a fazer-se obedecer pelos escravos que mantinha acorrentados para disfarçar instintos de que sem saber porquê, tinha vergonha!
Talvez por isso, de sabre em riste ele era o maior valente, de chicote na mão castigava quem mexia, sem dó ou piedade... na guerra, era um mestre e, no geral, a fazer sofrer é que compensava aquela frustração para a qual não encontrava saida.
À noite, com as mãos ensanguentadas dos crimes que fazia e que, esses sim, a moral prevalecente permitia... programava o futuro. Naquele dia, já tinha decidido... ia fazer rastejar as massas, mandar produzir mais canhões e, a seguir, ia matar leões, antes que se acabassem!... Já que tinha que sofrer, não iria sofrer sozinho!...
Deixava soltar um suspiro e caia docemente no sono como um anjinho, balbuciando: mamã.

quinta-feira, julho 07, 2005

Continuação 7

Van Gog, chegou a não ter dinheiro para comer e, não fora o apoio do irmão, não teria pintado muito da sua obra! O que ao tempo não tinha qualquer valor, é hoje, disputado por verdadeiras fortunas! ...Que contra senso é este, que leva os homens de "sucesso" (gente com os bolsos a abarrotar de dinheiro), a comprarem por tais quantias as obras pintadas por um "louco", ou, será melhor dizer... por um doente mental?!...
No início do sec XXI, passou-se em Portugal um facto, que ilustra claramente o que pretendo dizer: em cerimónia publica, o Estado, agraciou com uma medalha de mérito, Stanley Hoo, também conhecido como, "o rei dos casinos"! Justamente ao mesmo tempo, evitou receber oficialmente o líder espiritual do povo do Tibete... um Nobel da paz, um homem de inquestionável valor que enriquece quem o ouve!... Ao que parece, o Estado Português, prisioneiro de conjunturas e estratégias políticas e económicas, seguindo absurdas regras diplomáticas, prefere, através do jogo, enriquecer (?!) sugando-se a si próprio e, como se isso não bastasse, concede a quem dá a concessão para o sugar, uma medalha de mérito e, uma bela fatia!...
Factos destes, conduzem-nos á conclusão de que, a par e passo com este progresso que temos vindo a inventar, e, por muitas confissões que façamos, por muitas orações que balbuciemos... o nosso Deus, é, cada vez mais o dinheiro... convencidos de que, com ele, podemos comprar a felicidade e dominar o mundo do qual nos sentimos donos e senhores, ao vê-lo prostrar-se aos nossos pés, quando temos um punhado de notas na mão.
E, ai de quem ousar olhar-nos nos olhos, fazendo-nos frente, dizendo-nos em bicos dos pés, que não se submete ao poder que (presumimos), o dinheiro nos confere!... Essa, é uma das piores afrontas! Perante isso, esquecemos o significado das palavras que balbuciamos mecanicamente nos templos em que oramos pretendendo elevar-nos espiritualmente e, mandamos às urtigas os ensinamentos dos homens a quem chamamos Mestres ou Santos e dizemos querer seguir. Despeitados, dispomo-nos a meter o insolente na ordem e chegamos até a acreditar, estarmos a cumprir desígnios Divinos arrasando-lhe qualquer réstia de altivez ou dignidade e, sem piedade alguma, abandonamo-lo à sua sorte sem pejo (qual castigo/ensinamento), com a consciência de o virmos a encontrar despedaçado, pela máquina poderosa a que, o dinheiro/poder dá acesso.
Tão verdade hoje, como o era na pré-História ou na Idade média, esta realidade, continua a ser fonte de infelicidade e origem de muitas doenças...
Continuamos hoje, como sempre, a querer acreditar em contradições. Por um lado, insistimos em dizer, que o dinheiro não dá felicidade... que a saúde é a maior riqueza... por outro, destruímos a saúde numa luta desgastante, para ganharmos mais e mais dinheiro, na ânsia de não mais precisarmos dele e podermos (um dia) descansar e ser, "boa gente"...
Perseguimos a linha do horizonte que se distancia à velocidade com que nos aproximamos, na vã ilusão de a agarrar... apressados, queremos ir mais longe e, enquanto isso, não desfrutamos do que temos no lugar em que nos encontramos. Cegos para a realidade próxima, insensíveis para com a simplicidade, não vemos, que o excesso é tão nocivo como a carência e, fazemos dessa luta, dessa tonta correria, a razão da nossa vida!

sexta-feira, julho 01, 2005

Três em um

Ao que tudo leva a crer, a biomassa é uma fonte de energia que está a ser desperdiçada e para a aproveitar bastava limpar as matas abandonadas.
A limpeza das matas contribuiria para diminuir o desemprego, os fogos e quiçá, acabar com um negócio de aluger de aeronaves que a mim, me cheira mal.

quarta-feira, junho 29, 2005

O circo

O artista, pôs-se em risco sem temor! Dando o corpo ao manifesto, avançou para a pista, sem uma ideia cozinhada, uma cambalhota preparada, uma só palavra que fosse... na ponta da língua!
À ultima da hora, mandaram-no avançar para o centro e a única coisa que lhe garantiram foi, que os holofotes o iriam iluminar, fazendo-lhe notar que essa, seria uma bela oportunidade de brilhar, de mostrar o que valia a entreter e fazer rir, ou até, e porque não... a fazer chorar!...
Havia, no fundo, que entreter a malta, não fosse ela começar a patear, o que era muito mau, atendendo à fragilidade da estrutura das bancadas.
Socorreram-se dele, porque, o artista de serviço, com um número bem estudado, ao ver-se enleado nas cordas e argolas que tinha largado, sentiu o arame a fugir debaixo dos pés e, sem cerimónias, desenleou-se e lançou-se, seguro pelo guincho que o livrava de se estatelar e partiu, para actuar, num circo internacional.
...Surpreendentemente, o espectaculo ganhou cor com este artista que ficou e que tocava os sete instrumentos, dava cambalhotas direitas e tortas e, destemido, entrava no canhão pronto a fazer de bala humana, mas... os acrobatas que o acompanhavam, incapazes de lhes seguir os passos, os golpes de rins e os voos sem rede, cedo deitaram o número a perder... uma após outra vez, falharam uma recepção, um compasso, largaram uma corda, deixaram cair ao chão uma argola e, por último, os que brincavam a cuspir fogo, acabaram por se incendiar uns aos outros e causar, o pânico!
Hoje, o espectáculo está mais pobre! Dizem, que é para ser mais seguro... Só há um ilusionista, que tira da cartola uma sacola vazia com que se dirige ao público a quem pede para a encher... um número de ovelhas amestradas, que são tosquiadas na pista com as orelhas em baixo... e, claro... uma parelha de palhaços!... O rico... e o pobre, que, como sempre, passa o número a levar estaladas, e tão depressa chora baba e ranho... como salta, ri e toca a concertina... feliz de esperançado, em vir a receber um rebuçado!...

sábado, junho 25, 2005

Uma crença de mau gosto

Confia em mim!... Dizia o mastodonte ao brutamontes sem saber o porquê do que estava a dizer! Mas era escusado. O mal estava feito e iria continuar a ser feito, porque qualquer deles não tinha jeito... nenhum, para acautelar o bem do outro.
Confia em mim... dizia o bruto. O que achava, saber a razão da sua existência e teimava, em não dar o braço a torcer, enquanto não lhe estivesse a doer.
Confia em mim... dizia um, a quem... o quisesse ouvir. Mas já ninguém lhe dava ouvidos... Todos os passos tinham sido perdidos em labirintos reluzentes de palácios distantes e, a noitada, ainda agora tinha começado.
Falava-se... na altura, de profecias e conjecturas de sociedades secretas, de conjuras e medos, conspirações e segredos guardados, verdades antigas... perdidas... por gente tola e descuidada.
...Só que isso... não servia de nada! A realidade, construída por todos e cada um, implacável, impunha-se forte como se fora um megálito de chumbo sem dono. Um monumento ao qual... qualquer deles, cobardemente se dobrava, esperançado em obter respostas para perguntas que não tinha... e, subserviente, pelo medo do desconhecido... preferia aquela espécie de adoração, em vez de criar outra realidade a viver a própria vida!...
Confia em mim... diziam, um ao outro, com a mão cheia de nada que de tão vazia os iludia e levava, a fecha-la com a força de brutos que eram, teimando em acreditar lá estar encerrada, uma tal maravilha... que não dava para usar ou abrir mão dela!

terça-feira, junho 21, 2005

Continuação 6

Ainda que os mecanismos sejam pouco claros, é relativamente fácil encontrar uma relação directa entre o altruísmo, a disponibilidade para contribuir para a resolução dos problemas de quem nos rodeia, a vontade em fazer os outros felizes e a nossa própria felicidade e saúde!
Esse objectivo de vida, é, justamente o contrário de um outro, estereotipado e característico de uma sociedade muito competitiva, virada para o consumo, onde se pretende subir a qualquer custo sem perder tempo, pondo desde cedo em prática, a cultura do “cada um por si”, em que se valoriza o semelhante, em função dos bens materiais que ostenta ou que presumimos conseguiu acumular! ...Quem tem muito vale muito e, quem sabe... nos poderá ajudar a vir a ter, tudo aquilo que teimamos em acreditar ser indispensável, para a nossa felicidade!...
Daí, um tipo específico de reuniões sociais á laia de festas, onde as pessoas se procuram promover buscando atalhos para o “sucesso”, em que impera a conversa superficial e artificial, onde ninguém é sincero e se joga ao faz de conta, se vive da aparência e onde os meios para atingir os fins são cada vez menos questionáveis.
Ora, isto de pensar-mos uma coisa e numa ânsia cega para atingir-mos objectivos, fazer-mos outra, baralha o implacável e preciso sistema, do organismo profundo, que necessita de um equilíbrio e não se compadece com justificações esfarrapadas e contraditórias. Uma vez esse equilíbrio perturbado, essa contradição instalada, inicia-se um processo em que se vão manifestando disfunções aos mais variados níveis! Algumas dessas disfunções, manifestam-se ao nível do sistema neurovegetativo e estarão na origem de ulceras gástricas, tiques nervosos, arritmias, insónias etc. Perturbado o equilíbrio de zonas profundas, os sintomas, podem iludir o melhor dos médicos, particularmente se este não tem tempo, para analisar o doente em profundidade. E como se compreende, raro é o indivíduo que chega ao médico e diz: - Dr., estou aqui, porque quero subir na vida e para isso, não vi outra alternativa senão “comer a minha mãe viva”! Espezinhei o meu colega, entreguei os meus filhos ao “lobos” e, agora, não sei viver com o monstro em que me tornei! É provável que, este indivíduo, se queixe de dores nos ombros, tensão muscular, dores de cabeça, arritmias, insónias, disfunção eréctil... mas, iludido e enleado na teia da luta para o “êxito”, encara o seu comportamento como natural, legitimo e, essa perspectiva é reforçada quando, cedendo à vaidade à luz dos focos do “êxito”, se sente admirado e adulado, por uma série de abutres que pululam á sua volta (gente que sofre da mesma peste), oportunistas, que vivem da vaidade dos outros. E é assim, com o égo fermentado por tanta ambição, com o peito inchado de tanta presunção, que se dirige em crise, com a altivez que lhe resta, ao seu médico, a quem a troco de dinheiro exige que lhe faça desaparecer os sintomas e grande parte das vezes, com a arrogância á flor da pele, recusa-se a investigar e corrigir causas. É um indivíduo que tem pouco tempo, tem dinheiro e paga bem para o porem “bom”, sem suspeitar que esse trabalho, só pode ser feito por ele! Assim, sai do consultório com uma receita de analgésicos, relaxantes musculares ou calmantes, anti depressivos, anti ácidos e até inibidores dos ácidos, destinados a suprimir sintomas que, se recusa a interpretar como avisos, emitidos por um organismo profundo e inteligente, para um comportamento errado que teima em não corrigir, tendo em conta os objectivos que continua a perseguir obsessivamente, aplaudido por grande parte de um mundo que corre sérios riscos de se ver obrigado a encerrar para balanço!

A felicidade está demasiado ligada aos bens materiais. Numa sociedade de consumo como aquela em que vivemos, quem se vê impedido de consumir algo mesmo que supérfluo, sente-se inferiorizado e infeliz... na maior parte dos casos com aparente razão, uma vez que a sua auto estima é enfraquecida cada vez que se sente menosprezado, preterido, impossibilitado, não convidado... claramente por, apresentar sinais exteriores de pobreza, sofrendo todas as consequências que daí advêem!... Ele é o carro que não é novo, as roupas que não são de marca, a zona onde mora que não é prestigiada, o tipo de relógio que usa e uma infinidade de coisas que estigmatizam o indivíduo ao ponto de o fazerem desejar ser, quem realmente não é e até quem, poderá não se sentir bem a ser!

Exige-se a humildade do pobre, aceita-se a arrogância do rico e isso, tem repercussões na saúde, comprometendo até, a postura corporal! ...O pobre, anda mais dobrado!...

sexta-feira, junho 17, 2005

O rastilho

Estava longe a bomba! Era sempre o que se pensava e cada um achava que ela, lá tinha sido armada por alguém que não sabia o que andava a fazer! Era sempre assim! ...Quer dizer, ninguém era culpado de a lá ter posto. Agora o rastilho, esse, sabia-se bem quem o tinha acendido: fora um bando! Um bando grande e ao que se diz organizado, sabe-se lá por quem e com que fins!... O que é certo é, que esse bando agigantado, tornava o agigantar de um outro no extremo oposto, muito mais aceitável! Quer dizer... extremavam-se as posições, subiam as tensões, antigos combatentes já sem dentes vociferavam palavras de ordem que lhes tinham bailado na mente lá para as bandas do inconsciente e, até gente de bem, que teima em dizer não gostar de fazer mal a ninguém, espreitava a violência como forma de calar o medo e a insegurança! Os inocentes, gente fora de bandos, mais ligada à labuta que é ganhar honradamente o pão de cada dia, homens e mulheres de várias côres, olhavam-se de soslaio, com medo uns dos outros! Enquanto isso... gente sem rumo, saboreava a conquista do protagonismo, subia na hierarquia que estava à mão e, com o pelo na venta a crescer, o peito cheio de ar por achar estar a se afirmar... partia para aventuras que vira na televisão e tornava a fantasia realidade. O rastilho ardia. Ardia... porque se dizia, que a lei não permitia apagar o rastilho e, como se sabe, para mudar uma lei dessas, demora muito tempo, são necessárias muitas lutas, muitas batalhas de palavras, muitos pareceres e estudos especializados, muitos deputados agarrados a discussões politico filosóficas, muitas consultas à comunidade internacional, já que Portugal... gosta de tudo muito direitinho!... Era uma lei de difícil elaboração em nada comparável, com alterar leis laborais ou intruduzir novos impostos. O rastilho ardia, não se apagava. Quanto à bomba, isso então... nem pensar em desmontar. É que para isso, como sabemos, não há verba nem tomates!

quarta-feira, junho 15, 2005

Vamos lá a escrever á sorte, a escrever sem norte, a escrever sem intenção! Vamos lá a revelar o que de verdadeiro somos, a encontrar o que perdemos a oferecermo-nos uns aos outros... ou estão com medo?!
Vamos lá acreditar firme que algo em nós está certo, que o correcto é em função do agora e que o agora faz o sempre. Vamos lá andar pr'á frente, subir a montanha de problemas que é a vida, até ao topo que é o final. Vamos lá andar... ao menos! Vamos lá parar com o mal dizer sem apontar o erro e a sua solução. Vamos lá procurar em nós razões para tanto tombo tanta dôr e tanta agrura que se instalou e perdura como praga que corroi, que detrói em nós belos ânimos que podemos adivinhar a pairar num espaço, que mal conhecemos. Vamos lá a entendermo-nos (não... de uma vez por todas que já sabemos que isso... não dá), devagarinho, com a paciência de Jó ou outra qualquer... Vamos lá a acreditar que é possível e que para isso o nosso humilde desempenho é bem mais importante do que possamos ter vindo a pensar. Vamos lá, perante o escrito, o dito e feito... assumir os erros, enxotar as culpas e, fazendo um esforço, confiarmos nos passos dados, acreditando que estamos a aprender a caminhar, uns com os outros, cada vez melhor. Venha de lá essa abundância aberta e sem pretensões, esse altrúismo, essa riqueza de emoções que nos teimam em fugir, essa tolerância que te permita entender a importância de existir gente diferente e que te alimente a vontade de te descobrir em mim e aceitar, que afinal... qualquer de nós, faz parte de um todo em que o que nos separa existe, para sustentar tudo o que nos une.

terça-feira, junho 14, 2005

Convicção

Eu não me enquadro em nenhum partido político. Se alguns acham que é uma posição confortável é porque não me têm estado na pele e sentido o que é, defender hoje quem ataquei ontem, em favor da coerência que me tem levado a recusar usar, um carimbo na testa. Na realidade, o fanatismo chateia-me e, a minha ideologia, passa mais pela tolerância, se bem que se tenha vindo a revelar uma enorme utopia, de difícil mas estimulante, gestão!
Posto isto, não quero deixar passar em branco, a morte de três homens que (cada um à sua maneira) aceitaram o protagonismo, apostados em dominar as suas vaidades, acreditando estar a contribuir para que o mundo seja melhor. Se não o conseguiram, não foi por falta de empenho ou de sacrifício do seus interesses pessoais. À sua maneira tentaram contribuir... e isso, para mim, faz a diferença.

domingo, junho 12, 2005

Abanão

GNR trava onda em Quarteira
Um numeroso grupo oriundo de bairros degradados de Lisboa, lançou ontem o pânico na praia de Quarteira... e só não invadiram o areal, como alguns deles tinham feito na véspera em Carcavelos porque foram travados pelo pelotão ciclista da GNR.
Correio da Manhã do dia 12/06.

O fenómeno em Portugal é novo!...

Todos nós sabemos que, a esmagadora maioria, eram jovens Africanos (o que quer dizer pretos) dos 12 aos 20 anos...

Associações de emigrantes Africanos, manifestando a sua preocupação, pedem encontro com o Ministro da presidência, pedindo a oportunidade para apresentar propostas que visam minimizar estes e outros casos graves em que os jovens africanos nascidos em Portugal, estão envolvidos.
As associações, argumentam que estes problemas não se resolvem apenas com a intervenção policial.

Eu, reteria destas notícias uma frase: Um numeroso grupo, oriundo de bairros degradados de Lisboa...

Entretanto, vou abrir uma excepção e reeditar um post:

Guia prático para a construção de um moderno viveiro de marginais

1º - Escolher um terreno em que ninguém queira viver. Um sítio agreste e por isso barato, nos subúrbios de uma grande cidade.
2º - Construir lá, com pouca despesa, umas torres sem graça. Adicione-se um parque infantil com dois balouços e um bocado de areia. Não esquecer a escola para compor o complexo.
3º - Procurar famílias problemáticas, desintegradas, debilitadas ao nível físico e mental, económico e social, famílias... sem estrutura de recurso, em situações periclitantes que habitem bairros degradados, situados em terrenos com "potencial", cobiçados por construtores pontas de lança de instituições de crédito e bem relacionados com Câmaras Municipais e afins.
4º - Seleccionar os desgraçados por ordem e, em tempo útil, atribuir-lhes uma dessas casas estipulando-lhe uma renda dita simbólica.
5º - Convidar os órgãos de comunicação social para fazerem a cobertura da cerimónia oficial, em que, com pompa e circunstância, os representantes do poder político entregam as chaves aos ditos desgraçados. Promova-se uma entrevista a uma velha desdentada à qual seja ainda possível arrancar um pequeno olhar de esperança e um agradecimento convicto.
6º - Uma vez os desgraçados instalados, manter-lhes todas as premissas que os conduziram à degradação e, em lume brando, esperar que as crianças cresçam.
7º - Adicionar uma pitada de crispação dos habitantes da Vila próxima, em consequência de um ou outro acidente (vulgo roubo) que envolva pequenos grupos desses jovens sem referencias e educação e que se arrogam ao direito de possuir também, telemóveis, ténis ou roupa de marca...inconscientemente esperançados que esses artefactos, lhes permitam "ser como os outros", passar despercebidos e apagar um carimbo que trazem na testa desde que nasceram.
8º - Esperar que a revolta cresça... nos invasores e nos invadidos, nos assaltantes e nos assaltados... até que abra brecha.
9º - Juntar uns filmes de merda frequentes, ao alcançe de todos, decorar com o comércio de armas, drogas lícitas e ilícitas que engorda gente insuspeita que passa a vida a bater com a mão no peito sem dizer "mea culpa" e levar à mesa... regado com muito álcool ao qual é só puxar o fogo.
N.B. - Esta receita, deve ser confeccionada com muito cuidado, para não sair tudo queimado.

Após a reedição deste post, não posso deixar de fazer notar que, a maioria destes jovens de origem Africana, nascidos em Portugal, vivem em bairros de barracas muito mais próximo do "terceiro mundo" do que aquílo que alguns, possam julgar... lugares, em que a degradação, atinge a alma fundo... e dá, o que se vê! É preciso fazer um desenho?! Há ainda muita gente que pretende insistir em acreditar, que isto, tem a ver com a cor da pele?!

quarta-feira, junho 08, 2005

Pobres e mal agradecidos

Naquele castelo distante, a corte andava constantemente, numa azáfama! Aparentemente diligentes, procuravam com afinco, suprir as necessidades que criavam. Acabado um banquete, uma festa, uma orgia, um regabofe... urgia mandar fazer os preparativos para dar continuação à coisa!...
Os bobos da corte, corriam de um lado para o outro entretendo a gentes, abanando guizos e pandeiretas, fazendo piruetas e, largando um ou outro dito que, parecendo às primeiras... inconveniente, acabava por divertir aquela gente que, em vez de se ofender, pelo pouco que lhes ligavam, acabavam, por lhes achar piada.
Festa após festa, banquete após banquete, gargalhada após gargalhada em resultado da piada dita, pelo soberano... a corte, tinha havia muito, encarado a coisa como uma profissão... desgastante!... Quanto mais ria, gozava e se divertia, mais subia... na consideração, mais desenvolvia, a arte de bem lamber botas e de concordar com cara alegre com todas as ideias do soberano, ainda que fossem loucuras e puras idiotices. Em troca, levava esta bela vida que todos podem imaginar!...
Acabado o vinho, os leitões, porcos, vitelos e faisões... acabado o belo pão, a tábua de queijos e o molho de alcaparras... havia, claro, que tomar medidas para repor as iguarias na mesa do rei... e, a corte, estava lá para isso! Os camponeses, também...
...Membros da corte, especializados nesses assuntos de encher dispensas e tornar as mesas fartas, arquitectavam um plano à sombra do soberano (um homem a quem o povo reconhecia legitimidade para nele mandar) e, distribuíam ordens a quem ganhava os despojos por receber e cumprir ordens, sem questionar!
E lá saía uma equipe, para fora de portas, montada em garbosos cavalos negros enfeitados, homens fortes protegidos por pesados escudos, preparados com espada à cinta, para o que desse e viesse.
O plano, arquitectado por bêbados a ressacar e gordos comilões sem cerimónias, era mais ou menos sempre o mesmo: Mandar os mais brutos, às povoações a que chegavam em desvairadas cavalgadas, fazendo-se anunciar, tocando as trombetas! Depois, chamavam a atenção ao povo pelos seus descuidos, calcavam-lhe o égo forte e feio, cascavam-lhe no lombo e logo de seguida, quais pais complacentes que castigam por amor, lembravam-lhes, o quanto se arriscavam para os defender... das invasões, dos raios, dos coriscos e trovões, dos misteriosos perigos que estavam nos livros que só eles tinham e sabiam ler, e de todos os outros perigos desconhecidos, impossíveis de descrever...
...Resultava sempre!... De uma ou de outra maneira, cada aldeão, sentia a culpa a crescer, só de pensar nos sacos de batatas e nos presuntos escondidos, nos litros de feijão que tencionara não dar ao manifesto... e, entendia, que tinha vindo a ser pobre e mal agradecido. E era assim... que redimidos, carregavam eles próprios às costas, até à mesa do rei e da sua nobre corte, os produtos indispensáveis para que esses nobres, valentes e destemidos amigos, os pudessem continuar a proteger de tão temíveis e iminentes perigos...

domingo, junho 05, 2005

Rédea solta

Foi em desnorte e sem sentido
e pelo medo de estar perdido
que entre passos partiu de si
E foi sem querer em desespero
ciente de nada saber
que explodiu se encontrou e deu
Foi desse fora nesse aqui e agora
desse avesso a que chegou
que se entendeu olhou e viu
que era já tarde para qualquer começo
cedo demais para qualquer fim
e que se nada fora ganho
tampouco algo estava perdido
Viver parecia agora ser dar passos
pr’além de lhes buscar o seu sentido

sexta-feira, junho 03, 2005

Continuação 5

Estar de bem com a vida, querer realizar obra, encontrar a vontade para rir, para sentir prazer, em dar prazer, em visitar um amigo ou promover em redor um momento feliz é, justamente, o oposto da infelicidade! Sentir-se são, vigoroso, capaz e solícito é bem o contrário de estar doente, cheio de dores, queixas, ressentimentos e amarguras.

Sem felicidade, na ausência da capacidade para a procurar, mergulhado o ser num mar de agrura e ressentimento que inviabiliza a busca de soluções para os problemas com que se confronta, destorcida a perspectiva pela qual se poderia encarar essa busca e esse problema, como uma oportunidade na vida que nos ajuda a crescer, a progredir e não, como um infortúnio que nos bate á porta para o qual nunca estamos preparados, que nos abate e revolta... sem felicidade, sem a capacidade de lutar por ela a cada passo... dizia eu, é impossível haver saúde e vice-versa.
Se, a saúde implica a ausência de dor ou disfunção, orgânica ou psíquica, a falta da predisposição para a vida, pode ser interpretada como um dos primeiros sintomas de doença, em consequência, de uma qualquer, distonia.
O plano e o momento primordial em que essa distonia tem origem, nem sempre é possível de determinar! Pode acontecer ao nível da mente, no plano psíquico: um equívoco durante o processo de formação do carácter, um distúrbio emocional, uma premissa errada... pode ter um papel decisivo para se desenvolver um tipo de comportamento que cause alguma fricção, algum stress na relação que se tem com o mundo e isto repercutir-se na saúde orgânica do indivíduo. Por outro lado, também uma alteração do equilíbrio orgânico por razões tão fortuitas como, um excesso de poluição ambiental, uma intoxicação alimentar... terá repercussões no estado de espírito, condicionando o comportamento.
Temos por isso, que nem toda a doença tem origem na infelicidade e vice-versa. Existem doenças com origem em agentes externos: a poluição, a degeneração dos produtos alimentares, a educação incompetente e castradora, em que se alicerça o modelo social e económico em que vivemos -fonte de bloqueios, couraças e medos- que, fogem ao control do indivíduo. Contudo, através de complexos e (até ver) misteriosos mecanismos do sistema imunitário, o organismo defende-se e tudo leva a crer, que há uma maior resistência/competência desse sistema, numa pessoa que (disposta a rebuscar nas profundezas a força para esboçar um sorriso), persista na busca de caminhos para a felicidade... do que, numa outra que, sentindo-se traída pela sorte, assuma a tristeza como a consequência natural do estado a que o “destino” a votou e, viva, deprimida, revoltada, sempre dependente de ajuda, maldizendo e renegando a própria sorte. Ao contrário, pensarmos nos outros, tornarmo-nos disponíveis para ajudar alguém, pode servir-nos como acto profilático ou mesmo terapêutico, dar-nos mais força e resistência, fazendo-nos sentir úteis e por isso, dignos de amor, tão importante para a nossa realização e bem estar, integridade e saúde; física, mental e emocional e, se quiser-mos, espiritual!
No fundo o “truque”, parece girar á volta do dar e receber, do investir o melhor de nós, com a humildade suficiente que nos permita, reconhecer e corrigir erros, rumo a um ser cada vez menos imperfeito.
Trata-se, de ter um objectivo sempre á mão que passe por nos tornar-mos úteis a cada passo, mais que não seja... ajudando “a velhinha” a atravessar a rua!

sábado, maio 28, 2005

A inocência do accionista

O accionista recebeu uma pista! ...A coisa estava quente lá para o médio oriente. Poderia até estalar uma guerra! Espreitou por um lado, espreitou pelo outro... ponderou rapidamente e vendeu umas acções que tinha aplicadas em energias renováveis, para realizar capital e comprar umas outras de uma empresa, que fabricava mísseis de médio alcance muito eficazes.
Tarimbado neste jogo, comprou também, acções de uma empresa que fabricava anti mísseis e, prevendo a subida do preço do petróleo, comprou ainda umas outras, de uma empresa petrolífera, de um outro lado do mundo.
O accionista, recebeu uma pista e, na mira de lucro, pôs o seu capital ao serviço da guerra!
Depois, sentado na sua cadeira ergonómica, bebia notícias e, perante recuos e avanços, deixou-se tomar por uma estranha volúpia, um desejo abstracto (ou seria concreto...), para que desatasse tudo à porrada! ...Essa é que é essa!...

terça-feira, maio 24, 2005

Continuação 4

Temos doentes, gente diferente, deficientes, debilitados, degenerados... mas, podemos dormir descansados... O sistema oferece serviços, técnicos devidamente credenciados para lhes tratarem da saúde... Tem uma filha com deficiências mentais, uma mãe com Alzheimer, um filho drogado, uma esposa em desnorte que lhe causa embaraços, que lhe consome o seu precioso tempo e o confronta, com a necessidade de mudanças para as quais está indisponível ou se sente impotente?... Não perca mais tempo... não mude, nem questione nada. Confie, apoie-se no sistema e liberte-se do fardo entregando-o a uma casa de saúde, uma clínica especializada, uma instituição de saúde mental que não queima ninguém na fogueira e já nem electrochoques aplica. Durma descansado, mantenha-se na corrida para o êxito, em troca de uma (mais, ou menos), modesta mensalidade!...
Na sequência dos esforços sérios que o Homem tem feito para erradicar a doença e o sofrimento, faz todo o sentido, apurar o conceito de saúde e, por outro lado, ao invés de sonegar conhecimentos (através de um esoterismo conveniente a quem é pressuposto tê-los), torná-los cada vez mais acessíveis a quem deles quiser fazer uso, estimular aqueles que, por comodismo ou por qualquer outra razão, o não querem fazer e, procurar envolver os doentes na sua própria cura, sugerindo-lhe a necessidade, de identificar a origem da doença e de, transformar as condições que conduzem a ela, através da mudança necessária, da terapia adequada... seja ela fitoterápica, homeopática, quimioterápica, cirúrgica, espiritual... enfim, o que se encontrar mais adequado!
Não é minha intenção, através destas criticas, atacar ou desvalorizar, serviços e profissionais ou o desenvolvimento técnico e científico nesta área, é sim, contribuir para que cada um de nós, nos tornemos cada vez mais, responsáveis e interessados pela nossa própria saúde, esperançado que, a sociedade mude em consequência. Estimular a vontade de nos conhecer-mos melhor, de modo a que aprendamos a conservar-nos sãos, desde logo lutando pelas condições básicas de vida, sem as quais a saúde se torna impossível.
Antes do mal estar, da dor, da doença instalada, poderemos interpretar sinais que, ainda que vagos, nos alertam para a necessidade de alterações que, poderão interromper o desenvolvimento da doença, inverter o processo e evitar assim, cuidados médicos posteriores.
Muitos desses sinais escapam-se-nos, não são interpretados como tal e daí este modesto contributo, que espero, não tenha contra-indicações!

sexta-feira, maio 20, 2005

Continuação 3

Hoje, muito mudou! Graças aos pensadores livres, alguns medos deixaram de ter sustento, muitos tabus caíram e, ainda que outros se levantem e novos medos possam ser arquitectados por pretensiosos e ressentidos “senhores do saber”, alguma luz, tem chegado às trevas! A ignorância essencial, essa, que não permite “ver com o coração” e veda o conhecimento do fundamental, sempre camuflada, apresenta-se com novas roupagens mas, mantêm as máscaras de sempre; a da diligência, da responsabilidade, do sentido do dever, da consciência transcendente... da humildade dos sábios e, sem pejo, dá a entender saber coisas, com que nem sequer sonha! Questionada pelos mais afoitos, afirma não poder explicar o que ninguém iria compreender e, sobrevive assim, em todo o lado, com o conforto relativo que em geral é concedido, a quem, insinuando esconder por modéstia um misterioso saber que não pode ser explicado, deixa no ar a ideia de ter o poder de salvar, qualquer desgraçado...
Perante, aparentes e reais necessidades de promover, manter ou recuperar a saúde, muitas instituições, chamaram a si essa responsabilidade e, se bem que em muitos casos a sua utilidade seja inquestionável, noutros, não é assim! Os esforços para promover e manter a saúde, são débeis, e, muitos dos doentes que poderiam ser curados não o são, uma vez que se insiste em (apenas) anular sintomas, sem reflectir na origem/causa, das doenças...
Mantêm-se o estado das coisas... debela-se a febre e mantêm-se a carraça na prega da orelha!

terça-feira, maio 17, 2005

Continuação 2

...Perante uma crise convulsiva de um epiléptico, as consequências da ignorância, foram brutais e dramáticas. Os doutos sábios, recusando-se a confessar as suas limitações, incapazes da verdadeira compaixão e, confrontados com a necessidade de sossegar os espíritos perturbados por medos irracionais, que emergiam soltos de um misterioso imaginário... no mínimo, participaram na construção de soluções dantescas que, ao que parece, só o homem é capaz! Perante esse desassossego da família e da comunidade em geral, a impotência de magos e sábios, de líderes políticos e religiosos, muitos doentes foram torturados, mortos queimados em fogueiras santas, com a responsabilidade de autoridades instituídas e, enfim... de uma boa parte da comunidade que, refugiada na ignorância, queria acreditar ser essa a forma, de libertar o infeliz, de espíritos demoníacos, “purificando-lhe” a alma, para o resto da eternidade... Muitos desses rituais de carácter místico religioso e com alguma pretensão científica, forneciam à comunidade espectáculos públicos, que lhe permitia respirar de alívio... liberta, de tamanho incómodo!...
Dando largas à imaginação, conseguiam vislumbrar nos corpos contorcidos pelo horror, expressões e urros do Demónio, assim afastado por algum tempo.
Enquanto isso, alguns espíritos livres, abafavam no peito a revolta pela barbárie e, receosos de se verem envolvidos, relacionados ou acusados de artes de feitiçaria, ou de pactos com o demónio, viam-se obrigados a assistir impávidos aos crimes, que desde sempre, a ignorância tem permitido justificar!

segunda-feira, maio 16, 2005

Continuação 1

O mal estar, o estado agudo ou crónico de infelicidade e no geral todas as alterações de ordem mental, têm sido dificilmente enquadradas e aceites, como um problema de saúde. Não esqueça-mos, os muitos epilépticos ou esquizofrénicos que foram sacrificados pela ignorância, hipocrisia ou impotência, relegados para um papel de personagens a destruir ou esconder, entendidos como aliados do diabo ou instrumentos usados por forças ocultas com intuitos demoníacos.
Essas pessoas, num passado bem recente, não eram consideradas como doentes. Não tinham direito a esse estatuto. Acabavam, na prática, por representarem inimigos a abater, ou no mínimo, a esconder, pela afronta á sabedoria e pelo incómodo geral que causavam, quer por perguntas ou afirmações estranhas, como por comportamentos bizarros, para os quais a ciência e a lógica, não tinham resposta ou explicação. Ora, como é hábito nestas situações, em vez de nos confrontarmos com a ignorância e impotência, temos uma tendência natural para olhar á volta, em busca de um culpado. No caso dos esquizofrénicos ou dos epilépticos, atribuía-se a culpa, de uma forma abstracta, ao demónio, ou a algum espírito maligno, que possuía o desgraçado e que, agindo através dele, perturbava a ordem e a paz, estabelecendo dúvidas onde deviam reinar certezas. Muitas vezes eram encontrados responsáveis para estas situações perturbadoras; bruxas, magos, seres das trevas, servos do Diabo... gente, com o poder de endemoinhar uma pessoa, personagens, pertencentes ao imaginário do colectivo e, relatos de crânios furados para que o espírito perturbador se pudesse escapar, chegam-nos do Egipto de há três mil anos atrás!

sexta-feira, maio 13, 2005

Sobre a doença e a saúde

É um comum ouvir-se dizer, que a saúde é um bem essencial. Não é suposto, que alguém deseje ficar doente! Ninguém assume gostar de estar doente. A doença condiciona e é desagradável! Não parece por isso fazer sentido, alguém desejar ficar doente. Ao contrário, todo o doente, nesta linha de raciocínio, deseja curar-se. Porém, as coisas da saúde e da doença, não são realmente assim tão lineares e a verdade, é que em determinadas situações de desequilíbrio, muitos “optam”, a um nível mais ou menos inconsciente, pela doença! Pelos mais variados motivos!
Uma série de perturbações que têm vindo a ser designadas como doenças psicossomáticas, estão, a maior parte das vezes, relacionadas com a incapacidade para lidar com situações que seria pressuposto serem resolvidas e ultrapassadas, sem que o indivíduo entrasse em distonia. Contudo, é já clássica a expressão: gastrite ou colite, nervosa!... Por outro lado, é bem conhecida a relação entre o desgosto ou a tristeza e a propensão para a doença. Constata-se ainda, a facilidade com que algumas pessoas ficam doentes quando os “outros” as contrariam e a vida não lhes corre de feição, raiando a chantagem e a manipulação desses “outros”, através do seu estado de saúde!
Convêm entretanto não esquecer, que o conceito de saúde e de doença, fez com que na generalidade, se associe a doença á dor física e não se levem em consideração, muitos sintomas mais silenciosos e subtis, que poderiam servir-nos de alerta para estágios iniciais de doenças mais ou menos graves!

sexta-feira, abril 29, 2005

Paradoxo

Existe, à velocidade do pensamento, sem ter que sair do centro ou que carregar com o peso da existência. Liberto. ...De amarras do tempo e do espaço, de crenças medos e ilusões, do bem e do mal! ...Um ser livre, de energia pura. ...Daquela que pulsa e existe em todos os lugares.
É, todas as coisas e nadas, pedaços de si, creador de sonhos sementes de onde brotam realidades, espaços e tempos em que se expande e recreia. E, quando nessa senda se sente disperso... demasiado longe de si mesmo, concentra-se em matéria que de tão densa o leva a duvidar da existência! ...Daí se expande, em direcção a todos os lugares! Uma vez mais e sempre.
Existe, qual paradoxo, inventado por si próprio...

sexta-feira, abril 22, 2005

terça-feira, abril 19, 2005

Um momento de tréguas

Fogo na peça!... Gritava empolgado o cabo raso ao soldado, cumprindo ordens de um sargento ajudante que se mantinha distante e resguardado, não fosse o diabo tecê-las...
Naquela guerra, tudo era como em qualquer outra!... Todos queriam matar para não serem mortos... um clima de medo alimentava um ódio cego - fornecido na partida - com destino vago... um ou outro candidato a herói, sonhava com uma medalha, os militares de carreira preparavam a promoção e, na realidade, ninguém sabia, como se tornara possível aquele desamor que grassava campo fora; batalha após batalha, cada uma mais sangrenta que a anterior!
Falava-se, nas trincheiras nauseabundas, que no topo do comando havia um general, que por táctica obedecia a um civil bem colocado, membro de um clube a cheirar a rosas com interesses secretos em que as coisas fossem estando nesse estado. ...Mas isso, nunca foi autorizado a ser provado em tempo útil e, alguns dos que o diziam chegaram a ser condenados por difamação a indivíduo indeterminado...
O soldado - que acendia o rastilho, dava fogo à peça e disparava a bala, que alombava com a carga e cavava as trincheiras -, evitava o que podia, ver-se a braços com a alma suja! ...Cada vez que tropeçava num corpo abandonado a que tinha tirado a vida, escolhia acreditar, ter cumprido o seu dever, levando a cabo a missão que lhe fora destinada. ...Sem saber ao que andava ou o porquê do que fazia... não sabia, nem queria saber... mais nada!...
Finda a guerra, a euforia do saque - na paz que entremeia cada tumulto -, lambiam-se as feridas, vinham à baila os traumas e, em noites mal dormidas, havia quem sentisse a consciência pesada... mas já não valia de nada... uma guerra estava feita e outra... ao lume, fervilhava. Um lume... alimentado, por um civil bem colocado que garantia ser aquela a via para chegar à paz!
...Mas nunca nada foi autorizado a ser provado em tempo útil. Não se lhe sabia o nome e a morada e, o soldado, não sabia nem queria saber mais nada. ...Já bem lhe bastava expiar culpas e reenvindicar os direitos de antigo combatente.

sábado, abril 09, 2005

Contacto

Através de vidros foscos, olhavam-se desde sempre e, por vezes, chegavam a sentir-se cúmplices. Nenhum sabia quem o outro era, e qualquer deles, estava muito longe de se entender como parte de um ser uno. Alguns, tinham vislumbres em que queriam acreditar... mas as coisas eram vagas, e ao que uns chamavam de percepções, os outros garantiam não passarem de fantasias que alimentavam ilusões!
...Por vezes... um, esboçava um aceno, sem qualquer certeza de que alguém o recebesse. E, se por acaso ou necessidade um outro o percebesse... calhando (com mais ou menos fé), respondia. Sempre sem garantia de manter o que quer que fosse.
Mais que uma vez, viveram momentos suspensos que lhes pareceram de ternura e sintonia. Alguns, sentiram o coração arrebatado por uma estranha sensação fugaz, cujo sentido se perdia entre sombras projectadas em terreno desconhecido.
Em busca de contacto... palmas das mãos coladas ao vidro... a ponta do indicador... era o bastante para que a imaginação parisse brotos promissores de onde poderiam despontar futuros. E isso era o bastante para que se sentissem vivos e pertencentes a algo para além do concreto.
Outras vezes, sem que ninguém soubesse bem o como ou o porquê, viam nos seus próprios reflexos inimigos com que chegavam a lutar até à morte, movidos por paixões, convicções cegas e jogos de poder, em que ficavam todos a perder.
Quando assim era, qualquer palavra era a palavra errada e um qualquer motivo poderia servir de pretexto para inverter o sentido ao texto. Corriam em desnorte! Sacudiam do capote as culpas entranhadas nos ossos durante tempos sem fim de ilusão e reflexão baça e, em busca de um culpado creavam destruição, estilhaçavam os vidros e davam de caras consigo próprios!

sexta-feira, abril 01, 2005

O ilusionista

Foi com o sacrifício de várias gerações, que aquela moradia tinha vindo a ser mantida propriedade da família e, embora estivesse de certa forma degradada, continuava a ser, um motivo de orgulho para a maioria.
A história do antepassado destemido que a mandara construir, passava de pais para filhos e, à medida que ia sendo contada, adquiria novos contornos. Um ou outro acontecimento podia desaparecer ou nascer, consoante a imaginação de cada um, a geração e o jeito que esse retoque poderia dar no momento.
A casa, com a frente virada ao mar, implantada em terreno fértil, tinha nas traseiras hortas e pomares que confinavam com bosques e matas espalhadas por montes e serranias que, adquiriam tonalidades quase mágicas. ...Um sítio, em que qualquer um poderia viver feliz, não fora a volúvel tonteria de querer ter a garantia, de poder chegar, justamente ao lugar em que não se está, de vir a ter o que não se tem e, por aí além...
Um dia, chegou-lhes ao lugar, um artista... um verdadeiro ilusionista, com uma mala cheia de truques e magias a que ninguém resistiu...
Começou por lhes falar do saldo contabilistico e do saldo disponível...
Explicou-lhe o que era um número negatívo... uma conta a descoberto e as suas respectivas alcavalas, um cheque, uma comissão de atraso, um imposto do selo, uns juros sobre o empréstimo, uma compra com o dinheiro que se presume poder vir a ganhar...
Falou-lhes de conceitos e pôs-lhes notas na mão em troca de espaço no lugar. ...Na prática, comprou uma concessão, para explorar potencialidades com que nunca tinham sonhado! Montou uma banca, atirou um foguete ao ar e deu-lhes a provar salmão de tanques longuínquos, doce de morango com sabor a banana, água com várias cores e sabores, frutas lustrosas e sem bicho, ensinou-lhes regras novas para jogar à cabra cega, ao toca e foge... e, instalou nas traseiras - lá no lugar -, uma fábrica de fazer dinheiro em que pôs todos a trabalhar!
Pagava-lhes com notas e, em troca destas, tanto lhes vendia botas que se usavam em Paris, como o salmão que lhes tinha dado a provar ou, relógios da China que davam música... e, em momentos de maior amargura, adoçava-lhes a boca com doces de uma fruta que sabia a outra!...
Ensinou-lhes o que era o PIB, deu-lhes um cartão e atribuiu a cada um um NIB, promoveu os mais velhos e influentes a VIP, explicou a todos as virtudes do caviar fazendo-lhes crescer água na boca e, quando lho quiseram comprar, concedeu empréstimos celebrados em papel timbrado, contra hipotecas de parcelas da propriedade...
Entretanto, cada vez menos gente amanhava a terra! Chegavam a casa, cansados de dar à manivela na máquina de fazer notas e, por outro lado, em função dos preços a que o ilusionista lhes vendia os produtos que arranjava noutros lugares, tinha deixado de ser rentável fazer o que quer que fosse, para além de trabalhar nesta nova actividade tão lucrativa... De qualquer modo, os terrenos, cada vez mais sobrecarregados de detritos, produtos tóxicos, restos de tintas usadas na feituras das notas... tornaram-se estéreis e, à medida que a fábrica se expandia, o espaço que restava mal dava, para plantar uma couve que fosse!
Uma tarde de pescaria começou a revelar-se impossível, por falta de tempo - que era todo tomado a trabalhar, para pagar juros, comissões e prestações da hipoteca - e, na verdade, ao preço que o salmão lhes chegava à mão, compensava muito mais comprarem-no ao ilusionista, do que pescarem robalos no mar e apresentá-los no prato grelhados... particularmente aos miúdos, que só de os verem ficavam enjoados e infelizes, depois de terem ouvido o ilusionista falar, nas delícias do mar, sem espinhas, feitas de farinhas nutritivas com sabor a lagosta suada e com forma de monstros divertidos.
O simples e antigo ritual de apanhar frutos do bosque, caiu em desuso, perante a oferta das suas polpas finas, açucaradas, vendidas em embalagens atractivas coloridas, com as quais se desenrolavam vários sorteios.
Um dia... o ilusionista, que na prática se tornara em quem mandava, por ter ficado na posse do terreno a ele hipotecado, importou uma máquina de fazer notas semi-automática e, mandou para casa metade dos trabalhadores que se viram forçados a pedir dinheiro emprestado para pagar as dívidas que tinham criado enquanto tinham trabalhado a dar à manivela, mas, como já não estavam inscritos, viram os seus pedidos recusados e os seus cartões outrora dourados foram por magia transformados em pó!... Ficaram sem NIB, deixaram de ser VIP e nunca mais puderam comprar salmão vindo de tanques distantes, ou sumo de laranja a saber a framboesa...
A família, começou a olhá-los de lado, porque a bem dizer... desempregados e mal habituados, eram um fardo! Eles, viram-se forçados a entrar num programa de reciclagem instituído pelo artista, em que aprendiam a não existir e no qual foram bem sucedidos!
Em menos de nada, graças aos avanços tecnológicos, a máquina semi-automática foi substituída por uma outra, totalmente automática e todos os membros daquela família, ingressaram nesse programa de reciclagem, com excelente aproveitamento!
Hoje, embora o lugar esteja muito degradado, tóxico e viscoso, a produção de notas duplicou e a economia do lugar é das mais fortes do mundo! Quanto à antiga família, se bem que se saiba que andam por ali, não são vistos, nem tidos... nem achados...
Quanto ao resto, tudo está entregue a uma máquina, altamente sofisticada que faz notas como que por artes mágicas e, o ilusionista, continua a coleccionar propriedades e, a emprestar as notas a quem se apanha a desejar, comprar-lhe as botas que ele vende e que se usam em Paris.

quinta-feira, março 24, 2005

A invenção da garantia

Não se pode dizer, que tudo tenha acontecido de repente...
Quando, uma parte da maioria sucumbiu esmagada pelo peso da estrutura dos andares de cima - num acidente não coberto pelo seguro por via de uma alínea escrita em letra pequenina -, havia muito que alguns diziam ter ouvido o ranger das traves mestras e apontavam falhas; quer na estrutura, quer no terreno em que esta, tinha vindo a ser edificada. Diziam até, que a estrutura cheirava a podre e que a melhor solução seria, deitá-la definitivamente abaixo e construir uma outra de raiz, mais sólida e equilibrada.
A maioria, entretida na azáfama da manutenção da estrutura, não pensava assim, nem de outra maneira qualquer, evitando pôr de vez em causa o chão que pisava e aquilo que julgava ter adquirido!... Preferia, acreditar numa mão fechada cheia de um nada bafiento e num futuro que, de tão distante... lhe parecia brilhante! ...Diligente, insistia em sentir-se senhora de um hipotético império penhorado, desvalorizando o assunto... escolhendo entrementes assobiar distraída, melodias fáceis de entrar no ouvido, emitidas a toda a hora em programas de entretenimento.
Lá no topo, os vendedores de sonhos dourados e de negros pesadelos, loucos que se julgavam donos do mundo... não paravam de sobrecarregar a estrutura, atafulhando os andares de cima com baús cheios de tesouros pesados trocados por bugigangas. Continuavam, a encher estantes com títulos de registos de propriedades, inventados à pressão para legitimar terrenos saqueados. Passavam a vida, a anotar combinações secretas para os cofres que enchiam de diamantes feitos riquezas, e a mandar cunhar moedas segundo a velha receita - que detinham em segredo -, da feitura das fortunas... e, nunca se cansavam de afirmar, que tudo estava no seu lugar!
Por último, perante sérias evidências, chegaram a admitir que o edifício, até podia oscilar... estava, aliás, concebido para oscilar! ...Justamente para não ruir!...
A cada coice de culatra, a cada omoplata partida, a cada sonho desfeito feito drama, a cada tiro no pé, a cada Zé enterrado vivo "por engano"... lá vinham os argumentos da sorte e do azar, da conjectura internacional, da subida ou da descida dos factores determinantes, da baixa produção dos produtores... e, a malta... claro, nem pensava uma segunda vez e chegava até, a não pensar de todo! Trocava o que pensava ter, pela patranha e, uma após outra vez, mantinha - fazendo das tripas coração -, os pilares podres no ar, com o medo que a estrutura lhes caísse em cima e deitassem a perder, tudo aquilo que embora não tivessem - a ser como lhes garantiam -, talvez um dia... viessem a poder... vir a ter!...
Quem sabe... talvez um dia, pudessem também cagar diamantes!...
Alimentada por ilusões, mantida obediente, qual rebanho por medo de lobos maus, temerosa dos castigos eternos... por pecados inventados em sonhos e em noites escuras pintadas por loucos e ditadores, essa ingénua, essa estúpida e dócil de calculista, essa perversa de moralista... essa maioria, tão cruel quanto submissa... aceitava resignada "o seu destino", composto de licenças e multas, de cajadadas que agachada levava no lombo pregadas por pulso forte com frieza! Tudo... na expectativa de manter, a sempre vaga garantia (que se aproximava mais de uma promessa que tornava possível a esperança...), não da vida... mas da segurança! E essa, era dada, ou melhor... vendida, pelos vendedores de sonhos dourados e de negros pesadelos!
...Por dez réis de mel coado, pago, por cada dia que vivia, a uma companhia de seguros instalada num andar de cima, a maioria, que em caso de morte poderia ter a vida paga... assim andava, sem saber porquê, muito mais descansada!
...De pouco valia, àqueles outros (que eram só alguns), tentarem convencer a maioria, a abandonar a estrutura edificada, a serem donos da sua própria vida e guardarem o mel coado e as batatas para darem aos filhos, aos amigos, ou para trocarem com os vizinhos... é que aqueles outros, procurando preservar um mínimo de decência, insistindo na coerência, não lhe davam garantias... e isso, para a maioria, era inconcebível.

sexta-feira, março 11, 2005

Uma viagem de coragem cega

Revoltado o mar como estava durante aquela maré viva, abalava-te as convicções e reforçava-te os medos!
Quiseras... em aflição - dando a quilha à vaga e desfraldando a vela -, esperar dos teus pares as asas da fragata, a coragem e a cumplicidade... mas, a força com que o mar te abalroava, a água salgada que em vendaval te entrava pelo frágil bote adentro e te mirrava os ossos, uivou-te à alma - uma após outra vez - que estás só!
...Teimoso, não ligaste. Não quizes-te acreditar. ...Para o caso tanto se te dava!... Destemido, rumaste a um destino, por rotas que não vêm no mapa. Intrépido, à medida que avançavas vaga acima e te vias a mergulhar na cava que ameaçava destroçar-te, deste por ti abandonado. ...Justamente por gente que por medo abandona o barco e se faz náufrago agarrado a frágeis tábuas, ramos, troncos ou lixo, coisas diversas que por norma se mantêm à tona, enquanto eras assaltado por piratas e apontado como louco, por homens que se diziam de boa fé e que passavam ao largo da tempestade...
Salvo que foras um dia por ti mesmo (aquele outro que de si ninguém conhece)... conheceste-te a acreditar, que o que fosse se veria e, perante a brutalidade daquele mar que ameaçava destroçar-te, conduzir-te em vertigem por abismos escuros com que nem os mais fortes e rijos, os mais maus e duros, os mais corajosos em mar chão... se atrevem a sonhar... tu, avanças-te, agarrado ao leme, do cada vez mais frágil barco, de onde tantos tinham saltado descrentes na chegada ao bom porto que acreditaram desejar.
Sabias (e não te vou perguntar como)... que há mais mar que marinheiros, que depois da tempestade vem a bonança, que enquanto há vida há esperança, que quem almeja sempre alcança e que, a calmaria... apenas serve para retemperar forças. De contrário, seria o marasmo... e a vida, não seria esta utopia neste mar salgado, ora calmo, ora eriçado, que revolve e agita, que mata e cria, para que tudo continue sempre, como até aqui nunca tinha sido!
Sabias... mas duvidavas! Fustigado por ventos de poderosas rajadas, desgastado que estavas das estaladas e dos golpes brutos vaga afora até à crista... dos golpes baixos mar cavado frio e denso adentro...
Querias manter-te à tona... e quando um dia em bolandas, em plena tempestade descobriste que podias fazer disso o porto de chegada... a razão da tua vida... ela, pregou-te a partida e lançou-te para a tonta calmaria de uma estúpida enseada! E foi aí, que, dando conta das feridas, te encontraste esgotado a congeminar novas aventuras.

domingo, março 06, 2005

Uma visão

Extraordinariamente, vi-te partir na chegada!...
...Vinhas em crise, na recta da meta, esgotada da corrida, saturada do medo de não chegar ao fim! O corpo... todo dorido, ameaçava-te a cada passada deixar de obedecer à tua vontade, rendido ao cansaço, pronto a abandonar-te, a deixar-te sozinha na derrota, no caminho...
Olhei-te nos olhos, auscultei-te a expressão que trazias na face e no corpo, e durante momentos que pareceram sem fim... não te reconheci, de deformada que estavas! Espelhavas desanimo, esvaias-te em suor e, ofegante, incapaz de articular palavras... era assim que te queixavas. Esgotado o fôlego, não te ocorria nem conseguirias dizer nada, cansada que estavas dos estratagemas, de quem te punha a correr para apostar no teu adversário, e em redor, um turbilhão avalassador alimentava a tua dor. Um burburinho crescente de vozes e vaias, que fazia de ti uma gazela nervosa em fuga para a meta, consumia-te as últimas calorias. O vassalo impotente... mais uma vez crescia em ti, o galgo e a lebre fundiam-se-te na alma e corrias desesperada, em risco de te rebentarem os bofes, para gáudio de uma multidão que assistia distraída, segura do desfecho, trocando impressões sobre iates, corridas de cavalos de sangue puro, luvas para golfe de pele de pinguim, pitarocas de meninas de dez anos e falos cor de rosa... e tu, concentrada na corrida, avançavas em pedaços que abandonavas dispersos por onde passavas, sempre e cada vez mais em câmara lenta, com o burburinho destorcido pela lentidão, que te ecoava na cabeça, até que... já próximo da meta, no final daquela recta, na iminência do desfalecimento, da queda... deste conta dos sentidos inundados, pelo jorrar do champanhe que escorria nas bancadas delirantes com a vitória que a tua derrota coroara, pelas gargalhadas debochadas numa festa em que tu, eras o bombo! Sentiste-te atingido na alma, pelas graínhas dos bagos de uva a serem cuspidas para a arena, enquanto num olhar de relance sem dó, te vaiavam o lugar...
Não se sabe bem a razão! ...Nem todos respondem da mesma maneira! Mas tu... invadidos os músculos por uma subtância que eu julgo composta por revolta e indignação, cortas-te a meta no teu lugar... e partiste... sem parar, como uma seta, cheia de força, agora sem um queixume... rumo a nenhum lugar!
...Nunca ninguém mais te viu, a engrossar a bancada correndo com a força do crédito, oferecido na partida e retirado na recta da meta, já bem próximo da chegada...

sexta-feira, março 04, 2005

Acossado

Fugia de si próprio por veredas pantanosas, lançava-se em corrida desesperada ao longo de túneis escuros de que não lhes via o fim e, chegava até a sentir-se culpado, por essa fuga em demanda de paz, que havia iniciado desde que se lembrava de ser gente.
Quisera deambular livre, simplesmente. Extasiar-se com a beleza de prados floridos, embrenhar-se em bosques frondosos colhendo frutos e raízes silvestres, com que alimentar o corpo e regalar a alma. Quisera, comungar com a natureza, banhar-se e beber a água em ribeiros cristalinos, encher o íntimo com lampejos de felicidade ouvindo pássaros cantando, sentindo no âmago a vida que pulula e os odores inebriantes que, imaginava, inundariam essas paragens. ...Quisera, por um momento, encontrar-se a sós consigo, guardar no peito raios de luz que dançariam por entre a folhagem e à noite, vencer medos antigos das sombras, num banho de luar contemplando rendido e sereno, o céu estrelado.
Mas a vida, nunca lhe permitira sair do asfalto e os carreirinhos que pisava e não conhecia, os atalhos por onde em desespero se metia, iam todos dar ao ponto de partida!... Um sítio demasiado iluminado, que nunca lhe permitia ver sequer, a lua!
Perturbado... porque para com as obrigações que lhe criavam ele era faltoso, sentia ruir a estrutura e adivinhava-se apontado em cada esquina que dobrava, como um doido de cabeça estouvada em quem não se confia. Chegou até a sentir-se... o porquê dos males existentes e de outros que estarão para vir... e, era por isso, talvez até... só por isso, que almejava fugir. ...Não sabia como, nem para onde. ...Quando nasceu, todos os pedaços de terra tinham sido conquistadas e já tinham dono!
Pregavam-lhe multas, cobravam-lhe por tudo e por nada; o preço de um selo inventado, de um carimbo... uma comissão... e até pela dor que sentia no peito, pelo desgosto... lhe cobravam um imposto!
Mandavam-no ganhar o dinheiro para pagar... e ele, consumia para pagar, produzia para ganhar, ganhava sempre a perder, a toda a hora, em qualquer lugar, de qualquer maneira. Depois... claro, era multado!... Por ir apressado, por chegar atrasado, por não ter conseguido dar mais do que tinha!...
...Fugia de si próprio, envergonhado. Fugia parado. Obrigado a pagar para produzir, a comprar licenças para vender e a cobrar um imposto a quem lhe queria comprar, para depois entregar a quem no fundo geria a sua vida! Pagava para vender, vendia para pagar, pagava para não ser multado e quando o era, por não ter sido capaz de ganhar o suficiente... via a dívida agravada e chegou a ter que pagar com o corpo. Até que um dia... em agonia, sentiu-se forçado a vender fracções da alma ao diabo!... É que esse... pagava bem, e ele... estava cheio de dívidas.

terça-feira, março 01, 2005

A óptica da anti vida

Vem esta a propósito, do uso excessivo de antibióticos. Desta vez, foi uma associação qualquer de farmácias que referiu o facto. Eu, não pude deixar de achar estranho. É que, das duas uma, ou há ainda, uma terceira: Os médicos, estão a receitar antibióticos a mais, as farmácias estão a vender antibióticos sem receita médica ou, ambas as situações se verificam. Em qualquer delas, mais uma vez, quem se lixa é o mexilhão. ...Aquele animal que continua a ser visto como uma peça substituível a qualquer momento e que tem que andar até cair!
Longe vão os tempos em que as gripes eram tratadas com resguardo, cházinhos e canja de galinha! Hoje, a impiedosa máquina montada, exige peças novas ao mínimo sinal de fraqueza! Estar doente, ainda que com gripe, é visto como um sinal de debilidade que ninguém se pode dar ao luxo de deixar transparecer. Por isso, com a ajuda de médicos, cada vez mais eles próprios, peças com a função de manter as máquinas produtoras falantes em pé sem queixumes, recorre-se a patéticas medidas drásticas! E, na fuga para a frente, deste sistema anedótico, vão-se promovendo outras doenças, debilitando o sistema imunitário, sobrecarregando o sistema hepático, irritando o sistema gástrico, promovendo colites, estimulando tosses "secas"... tudo, por sua vez, dominado por mais e mais medicamentos...
Será que a industria farmacêutica tem o poder de pressionar os agentes envolvidos e é dessa forma que, comparando com outros países da Europa, vende mais em Portugal, ou, estamos perante a incompetência, a ignorancia, ou a pura insensibilidade?
Portugal, é o país da Europa que consome por habitante mais antibiótico (e, de largo espectro, à semelhança de outros países do chamado terceiro mundo)!

sexta-feira, fevereiro 25, 2005

Um desafio sempre actual

Joaquim Pedro de Oliveira Martins, em jeito de conclusão, escreve na última página do seu livro "Sistemas dos mitos religiosos" o seguinte:
A impiedade do coração é a fraqueza no braço e o látego no dorso. Uma sociedade materialista em que os homens limitam a vida aos anos de gozo, perdendo o sentimento do nexo do passado e da responsabilidade para com o provir, abandonando-se ao requinte e ao delitantismo como os atenienses de outro tempo, ou à brutalidade da riqueza com que se paga o fausto e as mulheres, como os romanos do passado; uma sociedade surda pelos gemidos dos que sofrem, pelas vozes dos que clamam, está condenada a cair. No gozo vai-se a força, no optimismo ingénuo pelas «maravilhas da civilização» perde-se o sentimento do que a civilização é, identificando-a exclusivamente com o luxo de artes mercenárias ou com a grandeza de obras apenas utilitárias. Perdido o norte, obliterada a moral, ignota a caridade, a vida torna-se numa luta sem nexo, e cada homem para o seu semelhante, hostis, inimigo, como era o estrangeiro na Roma bárbara. A ciência generalizada, e desmoralizada, é um instrumento grave na mão de homens bestificados: à navalha sucede o revólver, ao revólver os venenos subtis (estriquinina, aconitina), aos venenos quem sabe? o raio produzido por pilhas portáteis, quando a electricidade tiver dito quanto pode. Matar é a regra de todo aquele que não soube viver.
Amplifique-se o quadro que nos oferecem as grandes cidades com os seus exércitos de proletários, as opulências vulgares dos seus ricos, os desvairamentos das suas Bolsas, os seus bandos de facínoras, as suas plebes depravadas, a sua promiscuidade repugnante: amplifique-se, absorvendo a população ainda ingénua dos campos, e talvez não parecam quiméricos os receios de uma nova crise como a da Antiguidade, que também ouvira Platão e obedecera a Marco Aurélio. As oligarquias dos nossos ricos pedirão como as antigas uma espada que as defenda das plebes miseráveis também ávidas de gozar e a espada será um açoite, esporas e um freio - se por ventura houver janízaros bastantes para esmagar as multidões dos novos bárbaros. Chegarão a ver-se na Europa exércitos de berberes, de índios, de turcos assoldados pela França, pela Inglaterra, pela Itália, pela Rússia? O caso não seria novo, nem a solução imprevista.
Mas no dia em que tal sucedesse, a Europa acabaria, e sobre as ruínas de uma civilização algum futuro Dante veria no ondear fúnebre das multidões barbarizadas
Le genti dolorose
Ch' hanno perduto' l ben dello'ntelletto

Oliveira Martins, viveu entre 1845 e 1894.

sábado, fevereiro 19, 2005

Um ÁS, só.

Ele era um Ás, só! Não pertencia a qualquer naipe e quando se tratava de ir à mesa, fosse ou não por isso, punham-no logo fora de jogo! Às vezes, em jogadas mais rápidas, via-se com uma carta em cima a passar por instantes despercebido, mas assim que davam por ele, gerava-se uma confusão, diziam todos à uma que a vaza era nula e ele, dava por si num canto da mesa, arredado de jogo com frieza. Descartado...
Atirado, solto com desprezo por dois dedos, via-se num voo curto e rasteiro... fora de jogo, privado da magia que a esperança de poder ganhar nos dá. Mas isso, não era para ele o mais importante. O pior, era mesmo, sentir-se privado da possibilidade de ter esperança em si. De, como qualquer outra carta do baralho, poder vir um dia a servir para alguma coisa! Não estava por isso em questão, ganhar ou não! Muitas vezes tinha assistido a derrotas gloriosas e surpreendentes de outros Ases... cortados por cartas pequenas do naipe da mesa! ...Mas, ainda assim, adivinhava-lhes o prazer de terem feito parte do jogo e lia-lhes na cara o regozijo de terem sido olhados uma e outra vez, por olhos brilhantes, tidos como carta na qual se acredita e isso, por si só, ele achava que bastava, para qualquer um conseguir aceitar uma derrota com a cabeça erguida e manterem a vontade para voltar à mesa, com o mesmo entusiasmo em cada novo jogo. Podia sentir, a vida a subir-lhes medula acima, o bater desarvorado do coração transbordante de uma alegria contagiosa, tocados por dedos hesitantes. Adivinhava-lhes o arrepio da expectativa de poderem vir a ser lançados, numa jogada triunfante.
Por vezes, outras cartas que acabavam por terem pena de o ver fora de jogo, aconselhavam-no a aderir a um naipe! Convidavam-no a aderir ao delas!... As mais desinteressadas, chegavam mesmo a dizer-lhe para aderir a um qualquer... garantiam-lhe que no fundo ia dar ao mesmo... Mas ele, insistindo em ser coerente, fiel ao que sentia, mantinha-se irredutível e afirmava até orgulho em ser um Ás sem naipe, simplesmente. Dizia, alto e bom som, que pouco tinha em comum com os paus, que não estava de acordo com as espadas e que os ouros e as copas, lhe criavam ansiedade...
Ora, como é fácil de entender, a maioria das cartas não aceitavam esta posição e, não satisfeitas com o facto de ele estar quase sempre fora de jogo, faziam de tudo para o verem definitivamente fora do baralho! Aparentemente por isso, não paravam de lhe colocar questões estilo teste americano em que lhe exigiam um sim ou um não, como se tudo fosse passível de ser resumido a uma fórmula, em que se condena ou absolve, se é bom ou mau e as reflexões profundas não servissem para nada.
Um dia, saturadas das respostas que ia dando e que normalmente começavam por: Depende... , baniram-no definitivamente do jogo por decreto que instituía a existência exclusiva de quatro naipes!
Às primeiras, o nosso Ás só, sentiu-se sozinho. Mas, à medida que se foi erguendo e se fez ao caminho, foi encontrando outras cartas sem naipe, de cores que nem conhecia e que estavam interessadas em saber, do que é que depende... a vida de cada dia. Ases e Reis, Manilhas e Duques, Ternos e Quinas, aos magotes... cartas, que nunca tinham estado na manga e que sem que se tivessem dado conta jogavam um jogo em que todas eram indispensáveis.
Bem vistas as coisas, nem todo o losango é ouro, não há espada que sempre corte e há azares... que vêm por sorte!

quarta-feira, fevereiro 16, 2005

Guia prático para a construção de um moderno viveiro de marginais

1º - Escolher um terreno em que ninguém queira viver. Um sítio agreste e por isso barato, nos subúrbios de uma grande cidade.
2º - Construir lá, com pouca despesa, umas torres sem graça. Adicione-se um parque infantil com dois balouços e um bocado de areia. Não esquecer a escola para compor o complexo.
3º - Procurar famílias problemáticas, desintegradas, debilitadas ao nível físico e mental, económico e social, famílias... sem estrutura de recurso, em situações periclitantes que habitem bairros degradados, situados em terrenos com "potencial", cobiçados por construtores pontas de lança de instituições de crédito e bem relacionados com Câmaras Municipais e afins.
4º - Seleccionar os desgraçados por ordem e, em tempo útil, atribuir-lhes uma dessas casas estipulando-lhe uma renda dita simbólica.
5º - Convidar os órgãos de comunicação social para fazerem a cobertura da cerimónia oficial, em que, com pompa e circunstância, os representantes do poder político entregam as chaves aos ditos desgraçados. Promova-se uma entrevista a uma velha desdentada à qual seja ainda possível arrancar um pequeno olhar de esperança e um agradecimento convicto.
6º - Uma vez os desgraçados instalados, manter-lhes todas as premissas que os conduziram à degradação e, em lume brando, esperar que as crianças cresçam.
7º - Adicionar uma pitada de crispação dos habitantes da Vila próxima, em consequência de um ou outro acidente (vulgo roubo) que envolva pequenos grupos desses jovens sem referencias e educação e que se arrogam ao direito de possuir também, telemóveis, ténis ou roupa de marca...inconscientemente esperançados que esses artefactos, lhes permitam "ser como os outros", passar despercebidos e apagar um carimbo que trazem na testa desde que nasceram.
8º - Esperar que a revolta cresça... nos invasores e nos invadidos, nos assaltantes e nos assaltados... até que abra brecha.
9º - Juntar uns filmes de merda frequentes, ao alcançe de todos, decorar com o comércio de armas, drogas lícitas e ilícitas que engorda gente insuspeita que passa a vida a bater com a mão no peito sem dizer "mea culpa" e levar à mesa... regado com muito álcool ao qual é só puxar o fogo.

N.B. - Esta receita, deve ser confeccionada com muito cuidado, para não sair tudo queimado.

terça-feira, fevereiro 15, 2005

Um mundo colorido

Ao alcance de um botão, temos o mundo em resumo, na mão. ...Em documentários, reportagens, notícias breves. E, temos até o direito a espreitar a opinião padrão que nos aparece pré cozinhada, embalada, pronta a cair no prato, a ser engolida num trago e digerida num ápice com a tranquilidade de quem sente que o caso fica entregue e resolvido!...
Temos de tudo ao alcance; consoante a hora, o programa, o canal... Podemos entrar casa a dentro da família degradada e com falta de estrutura. Podemos olhar a miséria em grande plano... ver o tecto que abateu! Podemos imaginar o frio que alí habita... que regela e trás ranhosas as crianças mal criadas... entregues à sorte, à impotência/incompetência de um casal... que ele próprio... desde sempre... precisava, de uma restruturação geral, mas que, entretanto, por várias faltas e excessos, vive débil e dramáticamente agarrado a um "rendimento mínimo", graças à boa vontade de uma assistente social, de um ministério, de um sistema que teima em mascarar sintomas preciosos!...
... Podemos ouvir os testemunhos de uns vizinhos que lhes dão couves, ou de um padre que ainda num outro dia lhes deu cobertores. Podemos ter pena. Podemos até... zarpar para outro canal!...
...Pode parecer que temos tudo... falta-nos o essencial...

domingo, fevereiro 13, 2005

Amor ou talvez não... como sempre

Ia ele atarefado, no meio da multidão, quando o móvel tocou.
- Tou tou?...
Do outro lado, uma voz macia, com duas palavras, abalou-lhe toda a estrutura:
- Olá, "Fontanela"...
Estremeceu! ... "Fontanela" era o nome que usava num blog que mantinha e, fosse lá pelo que fosse, nunca tinha contado essa parte da vida a ninguém!... Mal refeito da surpresa, respondeu:
- "Fontanela"?!... Mas... quem é que fala?!... Com quem é que quer falar?
- Ora... deixa-te disso! Claro que é contigo que quero falar e pouco me importa o teu nome! Sabes ou não que eu existo, que comungo das mesmas ideias e das mesmas preocupações?... Tens ou não a noção que estamos muito próximos um do outro, que somos células do embrião que se está a formar?...
Por breves momentos que lhe pareceram eternos, ficou sem saber o que dizer... talvez por isso, numa tentativa de ganhar tempo, insistiu:
- Deve aquí haver um engano... para que número é que quer falar?
Mas a mulher, com voz doce que a ele lhe parecia estranhamente familiar, não lhe abria uma pequena brecha por onde se pudesse escapar, antes o encurralava e obrigava, a encarar que sabia perfeitamente com quem estava a falar. De resto, grande parte do dia pensava nela, muito do que dizia, tinha a ver com o que ela escrevia e, já não sabia, como se tornara possível uma tal empatia com alguém que não conhecia. Estaria ele contagiado com uma peste moderna, propagada através da net que se instalava e desenvolvia no terreno fértil do imaginário dos homens sós? Mas a voz doce não lhe deu tréguas e lançou um desafio demolidor:
- Um doce... em troca do meu nome...
Ele, engoliu em seco. Pelo absurdo da situação, mas, acima de tudo pela íntima convicção de que ela, era a "Ilha submersa", a mulher a quem tinha vindo a seguir com minúcia tudo o que ela teclava e com quem frequentemente trocava comentários! Á partida não tinha qualquer lógica!... De qualquer modo, num impulso sem explicação, como num sonho, arriscou:
- És a "Ilha submersa"...
De imediato, a chamada caíu e ele, num gesto largo, afastou o telefone do ouvido e olhando desolado em redor a multidão atarefada, viu surgir direita a ele, uma mulher com um telefone na mão, que se aproximou bem pertinho e insinuante lhe disse:
- Bingo!

terça-feira, fevereiro 08, 2005

Pais desnaturados

Num sítio escuro, estreito e dito agora sem saída, vive uma criança perdida há já muito abandonada, por quem em tempos lhe dissera que a amava e a defenderia, dos papões que sem pejo lhe criava...

Tudo começou... quando pérfidos senhores da guerra, através de um velho processo de conquista, se tornaram donos da terra em que vivia, esculpindo-lhe desde logo na alma monstruosos inimigos, contra os quais lhe semearam na mente ódios cegos sem outra saída que a guerra, ao mesmo tempo que lhe impuseram a vontade que assumiram, de protegê-la de vindouros e terríveis perigos!
Feitos assim senhores de condados inventados a fio de espada, tornados novos usuários de velhos castelos, pediram-lhe em troca ajuda com a sua contribuição, para a defesa do condado... Uns produtos da horta, umas saquinhas de grãos, um tonel de vinho, um ou outro porquinho... produtos, para levar à mesa, que lhes dessem forças para a defesa...
Mais tarde, pedir-lhe-iam a própria vida, em lutas que promoviam contra esses monstros por eles criados... e a criança, vendo-se forçada a encontrar a coragem para responder ao solicitado, deu por si a subir à muralha e a dar o peito à flecha!
Depois, aproveitando as artes que os seus antepassados lhe tinha ensinado, puseram-na a fabricar latas e elmos com que a vieram a fardar, pesadas lanças e espadas mágicas com que a vieram a armar, tornando-a capaz de vencer dragões e de cortar de um só golpe, várias cabeças de um inimigo que de outra forma... nunca ninguém teria imaginado.
Umas vezes a pé, outras, montada num cavalo alado ou embarcada numa caravela, a criança, protegida por um Deus até aí desconhecido, partiu para toda a parte por medo, em busca de paz e salvação!
Foi assim que venceu e matou monstros arrepiantes, infiéis com pactos com o Diabo... gente estranha com a cabeça envolvida por turbantes, selvagens parecidos com os homens, que choravam como os macacos e que desventravam grávidas e comiam crianças... espetou bandeiras em chão longínquo, fez das tripas coração comendo o pão de cada dia retirado de saques sagrados com que cumpriu a sua missão de trazer tesouros... riquezas, que alimentaram a expansão de um novo Império! Levava na bagagem a fé, um evangelho com novas leis e rituais que tornavam possível oferecer o perdão a bárbaros e infiéis, libertá-los de velhos mitos, oferecer-lhes um Deus verdadeiro e a própria civilização...
Disseram-lhe na partida, para matar à vontade... que assim se conquista a vida...
Hoje, os ventos mudaram e muitos dos que a aclamaram são agora quem a condena! Os senhores da guerra, entretanto, foram saindo de mansinho, adoptaram novos discursos, outras roupagens, alugaram os condados a estrangeiros endinheirados, guardaram o produto dos saques em paraísos fiscais e partiram! Hoje, são eles que andam mundo fora, umas vezes na neve... outras em paraísos tropicais... Para trás, ficou uma criança abandonada num beco escuro, a lamber feridas da culpa, de costas voltadas para a saída...

quarta-feira, fevereiro 02, 2005

O meu sentir à família Cabral

Ele nunca foi presidente de coisa nenhuma e a palavra que botava, raramente ia além do seu quintal, desde sempre modesto. Nunca lhe deram medalhas... todas as batalhas que ganhou, ganhou-as em recato e de tão pouco espalhafato dir-se-ia, que o voto que teve na vida foi quase nulo.
Passou-lhe ao lado, essa coisa de ser um profissional de sucesso, investiu quanto tinha em ser Homem e nunca entendeu muito bem o que eram essas cruzes que alguns ostentam ao peito... as rosa cruzes, as cruzes de Malta as cruzes da ordem do cavaleiro...
Ele tinha uma cruz, que carregava em silêncio e sem queixume e bem vistas as coisas, ninguém sabia se, ou quanto, ela lhe pesava.
Escolhera há muito, ser membro inteiro daquela família, amigo e companheiro, cúmplice até à medula... e isso, pouco a pouco, foi-se tornando incompatível com a realização profissional e com as conquistas noutros horizontes com que os homens crescidos sonham...
Viam-no, a fazer quase nada! ... As compras para casa, as visitas regulares ao centro de saúde, uma ou outra incursão ao mundo da assistência social em busca de sentido e de justiça... sempre com a sua Paulinha! A sua filha, a sua grande amiga e companheira com que se aventurava culinária afora, viajando pelo mundo dos sabores, uns mais, outros menos exóticos... na invenção de uma doçaria... de uns salgados com o toque de uma especiaria...
Quando se tornava possível iam à pesca ( o mar, para esta família sempre se tornou um pouco longe!... )! A Paulinha, embora já adulta, não tinha a destreza suficiente para colocar o isco no anzol... e ele ajudava... explicava mais uma vez como se fazia... Depois, com a cana na mão, falavam da vida, do mar, do céu e sabe-se lá, do que mais! A Paulinha, escutava com atenção e ia entendendo o mundo, melhor que muita gente que há por aí com o peito cheio de gran cruzes e medalhas! Falar, falava com mais dificuldade, porque lhe custa articular as palavras, mas ele, compreendia-a na perfeição.
Talvez, que se ela não tivesse nascido com o cordão umbilical enrolado ao pescoço, nunca se tivessem entendido tão bem e muitos dos momentos felizes que passaram não tivessem acontecido!...
Amanhã, o Srº Cabral, tem direito a funeral! Ninguém lhe vai erigir uma estátua e adivinho que não vai ficar com o nome na História... mas no meu entender, o Srº Cabral, foi um herói maior que muitos, que ostentam as tais cruzes ao peito e têm direito a estátua... na verdade, não são estes que fazem a História! Ela, é feita, por muitos homens como o Srº Cabral, que nunca ganharam uma medalha nem quizeram lutar por isso... a sua luta, era outra!...

sábado, janeiro 29, 2005

Doce amargo

A vida tem marés, tal qual o mar.
O mar, umas vezes parece irado! Bruto e revoltado eriça e revolve o fundo, agita a superfíce e bate na rocha dura até a transformar em areia grossa. Outras vezes, de tão calmo e espelhado, reflecte a tranquilidade que ele próprio assim transmite e que nos pode até levar a pensar, que essa é uma situação, que nunca irá mudar!
Ou, de outra maneira, se quiserem... a vida tem fases, como a lua. Umas vezes cresce brilha e alumia, enquanto noutras... escurece e mingua, quase que desaparece e até parece ter entrado em período de tréguas com as trevas.
A vida, de qualquer modo, é uma doida varrida, fogosa, que nos cavalga aos ombros e nos maneja as rédeas... que nos puxa, ou alivia, o freio. Tanto nos espicaça como deixa à rédea solta. Umas vezes pesa e outras nos eleva...

sexta-feira, janeiro 28, 2005

O penitente

Ele era uma pessoa normal. Temente a Deus, católico não praticante por tradição, apostólico sem saber porquê, romano porque era latino, baptizado em pequenino e até já casado pela igreja, para não desgostar a família!...
Aprendera entretanto... que no prazer se escondia o pecado, que da dor, da miséria e do sofrimento, vinha a redenção e que, era mais fácil um camelo passar pelo buraco do cú de uma agulha, do que um rico entrar no reino dos céus!... Temer a Deus... enfim!...
Paradoxalmente, tinha imensa pena dos"pobres" e das gentes em agonia... o que fazia com que, à noite, depois de se deitar, de se aconchegar e aquecer, nunca se esquecesse de orar a Deus; pedia, cheio da esperança possível, para que Ele fizesse justamente o que ele não fazia no seu dia a dia... e tornasse mais suportável o peso da cruz ao miserável.
...Esta pretensão (fruto de uma reflexão sonambula), tinha no entanto um senão que tornava este pobre crente num coitado quase arrependido de ter orado e pedido!... É que, ao pedir a Deus para amenizar a dor ao sofredor, sentia-se a dificultar-lhe a entrada no reino a que ele próprio (assim com'assim...) aspirava!
...Um dia, mal acordado, estremunhado, com a alma cheia de culpas e a consciência pesada pelo mal que por bem tinha vindo (ainda que só...) a pensar, resolveu penitenciar-se. Libertar-se da piedade que fazia dele um egoísta e, decidido a disfrutar de prazeres e riquezas, procurou compensar todos de quem tinha tido outrora imensa pena, explorando-os até ao tutano, infligindo-lhes sofrimento, atingindo-os na outra face... tudo, por forma a não terem tanta dificuldade a entrarem no tal reino, de que ele tinha descoberto a chave...

quarta-feira, janeiro 26, 2005

O gigante assustador

O Adamastor, era um gigante assustador pelo medo plantado num cabo, que ninguém sabia se por Deus ou pelo Diabo e que teimava, em criar dificuldades e tormentas a quem o quisesse dobrar. Muitos dos que partiram, embarcaram nessa aventura quase ou mesmo obrigados. Uns, por falta de alternativa, outros, saturados da miséria. Ambos levavam no peito a ânsia de chegar a terras da boa esperança em que o mel fosse mais doce, não houvesse fel e o ouro brilhasse mais. Alguns... poucos, foram pela aventura, almejando vencer medos desbravando mares ou até com fé de encontrarem, partes de si por aí espalhadas, que lhes pudessem encher vazios que os traziam incompletos.
Partiam por levas, uma e outra vez... e eram os poucos que voltavam, vencidos por esse gigante arrepiante plantado no cabo, que contavam da sua assustadora monstruosidade, da sua grandeza e enorme ferocidade. Uns, tinham-lhe visto claramente vistos os olhos imensos, ameaçadores e faiscantes, outros, tinham ouvido ensurdecedores bramidos trovejantes e outros ainda, por forças misteriosas petreficados, impedidos de ver e ouvir pela própria tempestade, puderam ainda assim com muita certeza adivinhar, por entre chuva e rajadas de vento sobrenaturais, o gigante a lançar certeiro raios e vagas aterradoras, de que só se salvavam os mais cobardes ou aqueles que por mister ou destino lhes cabia vir mais atrás e, claro, os outros a quem Deus, por razões que o homem desconhece, decidira "deitar a mão"!
Os que tinham ficado, os que participaram à força de braços, de sangue, suor e lágrimas, na construção das naus agora feitas destroços, desanimaram... ouvindo relatos sobre a altura e a força do gigante... imaginando os seus bramidos e poderes devastadores! ...Mas já na enxerga, enquanto recuperavam forças, viam o desânimo transformar-se em raiva, o medo transformar-se em revolta contra o dito e era daí que nascia a vontade e a determinação, para cada um à sua maneira, apurando a sua arte, continuar a construir naus, cada vez melhores, mais fortes e até... mais belas.
Apurou-se a arte de navegar, agigantou-se o sonho e a aventura e todos prosseguiram as suas tarefas em sintonia, perseguindo o objectivo que era: Dobrar o gigante!
Hoje o gigante, feito rochedo desde a altura em que foi dobrado, esvai-se em areia fina... Nacionalismo à parte (porque isto tem mais a ver com a vontade dos homens e ele há-os por todo o lado), parece-me uma bela história...

sábado, janeiro 22, 2005

Défice

Os portugueses, andam desanimados... ombros caídos... olhos no chão... sentem-se traídos e vão ressentidos, arrastando-se penosamente na vida, em busca de terra firme ou, na sua falta... de culpados, que lhes tirem algum peso dos ombros! Sentem-se perdidos e sem rumo, neste país caravela desde sempre por vagas lambido. Ora contra, ora ao sabor do vento, da corrente e ainda que por vezes, com as velas esfarrapadas e o casco cheio de rombos das tormentas... vai... este povo, enfrentando os medos, os monstros e gigantes... e com essa matéria fabricando o seu destino.
Mas... há um défice! Um défice enorme de esperança... de coragem e garra, de vontade e determinação de chegar a bom porto. E esse défice, é bem pior do que o outro, de que tanto se tem falado. Não se resolve com teorias de economia de mercado, com operações de cosmética contabilistica, ou golpes de rins da engenharia financeira!
Há um défice. Agigantou-se agora mais uma vez o nacional fatalismo e já pouco interessa de quem é a culpa. Isso é passado!
Urge sacudir do pelo o ressentimento e o queixume, aceitar cada problema como um novo desafio, desatar cada nó que nos tolhe, bradar cada vez mais alto a liberdade e bater cada vez mais forte o pé à desdita, destemidos.
Urge sair do marasmo, pelos filhos, pelos avós e por nós. Sair da conversa de ir ao pipi, que anda à roda... à roda... não dá nada e que espremida, não deita uma gota.
Urge acabar com a inveja e a cuscuvilhice, com a crítica da política do bota a baixo e com a lógica de que é isso que nos põe em cima, sem sequer tentarmos elevar-nos para não corrermos o risco de fracassar.
Urge cultivar a excelência, a perfeição no pormenor, a gentileza escorreita, o olhar e o gesto solidário. O resto são tretas embrulhadas em papel de seda!
Urge mandar às urtigas os medos, chamar os bois pelos nomes e acabar de vez com o servilismo hipócrita e sem sentido.
Urge alcançar o máximo de humildade, com doses q.b. de auto estima que sempre jorra da solicitude enquanto vontade de ser útil.
E... quando com vozes melosas nos disserem: vêm por aqui... urge, analisar-mos muito bem, com a nossa própria cabeça, se é isso mesmo que nos convém.

sexta-feira, janeiro 21, 2005

Numeros redondos

770 milhões de euros - submarinos
252 milhões de euros - helicópteros
480 milhões de euros - aviões
334,2 milhões de euros - blindados

Total - 1.836,2 milhões de euros.

O hospital de Évora (por exemplo), tem vindo a fazer notar a necessidade de uma unidade de radioterapia. Custa 5 milhões de euros e evita a deslocação sistemática de 1000 doentes, do Alentejo até Lisboa.

quinta-feira, janeiro 20, 2005

Como vender um andar à filha em segurança ou como comprar um andar ao pai sem lhe ficar a dever nada

Com os filhos todos casados, os pais viviam agora numa casa demasiado grande e como em tempos tinham comprado um andar para alugar, agora devoluto, resolveram, por ser mais pequeno, mudar-se para lá!
Como o negócio do arrendamento se tinha revelado aquém das expectativas, sem falar das chatices que lhes tinham criado... resolveram vender o apartamento maior e pôr o dinheiro a render... no banco!
Uma filha agora a viver num andar demasiado pequeno por via de ter tido dois filhos, pensou em comprar o andar aos pais! Pôs a casa pequena à venda, pagou ao banco a hipoteca e negociou um novo empréstimo para comprar a pronto a casa aos pais que ficou por sua vez hipotecada. Os pais, meteram o dinheiro no banco a render numa conta a prazo e vivem agora dos juros.
Entretanto hoje, tanto a filha como os pais se queixam do banco. O pai, diz que recebe pouco e a filha que paga demais!...
Eu, depois de ouvir o que um paga e o que o outro recebe, não resisti a levantar a hipótese de terem feito o negócio entre eles: A filha vendia o andar pequeno, pagava a hipoteca ao banco e dava o dinheiro que sobrasse aos pais. Depois, era simples... a filha ia viver para o andar grande e ficava tudo em família. Em vez de pagar a prestação ao banco, pagava aos pais. Os pais, em vez de receberem do banco, recebiam da filha. Um pagaria menos e o outro receberia mais!... Mas disseram-me logo: Ó pá, isso assim, dava uma enorme complicação e se calhasse ainda se arranjavam chatisses!... E eu acredito! ...E dizem eles mal dos bancos!

terça-feira, janeiro 18, 2005

Querida ONU:
Escrevo-te, julgo eu oportunamente! Nem sei se tão depressa vai surgir um momento tão oportuno! É que os Americanos estão muito sossegados e eu pensei que talvez fosse de aproveitar a ocasião e mandar lá à América uns inspectores! ... Desses... das armas de destruição maciça! Sugiro-te esta acção, porque tenho fortes razões para acreditar que os tipos, com a mania das grandezas que têm, acabam por ser uma ameaça para o mundo! Não é que eles façam por mal! Talvez! Eles até têm explicado muito bem que nos estão a proteger a todos uns dos outros e olha que bem precisamos, porque tu por vezes parece que andas distraida!... Mas é que já não é a primeira vez, que eles ameaçam destruir e destroem mesmo e outras vezes em segredo e sem avisar. Cá para mim, desde que eles fizeram lá aquilo das bombas nucleares em Hiroshima e Nagasaki, confesso, fiquei sempre com um pé atrás!... (destruição maciça, mesmo... foi aquilo!)
Julgo que seria uma bela medida porque ao que parece os homens andam a brincar com o fogo e então mais vale tirar-lhes o fogo das mãos, não vão eles deitar fogo ao que ainda não está a arder! E já agora, eles que se deixem de tretas e assinem o tratado de Quioto que se faz tarde!... Senão... (podes dizer-lhes que fui eu que disse) não vejo nem mais um filme americano. Eles que vão vender a realidade a outro!

segunda-feira, janeiro 17, 2005

Ladrões e polícias

Perdoem-me os ladrões e os polícias! Esta história não pretende retratar qualquer situação real. Apenas tem por objectivo, ombrear com esses programas de entertenimento que alcançam enormes audiências e divertir, entreter e bem dispor! Se bem que não tenha a certeza de que esse objectivo possa vir a ser alcançado, espero com sinceridade, que não venha a ter o efeito contrário. Faço notar contudo, que a continuar a ler estas humildes linhas, o leitor, deve ter em consideração de que esta, é uma história sem pés nem cabeça, que faculta à pessoa que a lê a possibilidade de não pensar durante algum tempo, em coisas sérias da vida que só lhe trazem é ralações, mas... mantem contudo intacta, a liberdade que o leitor tem, de pensar no que lhe der na gana e melhor lhe convier!

- Achas... que eu deva vir a ser polícia ou ladrão? Perguntava a criança à mãe, olhando para o mundo da forma simples e com o espírito pragmático próprio das crianças, que reduzia as escolhas a estes dois extremos opostos, como se entre eles , não existissem bombeiros, pilotos de aviões, médicos ou maquinistas de comboio!... A mãe, posta assim perante a questão, estilo teste americano de sim ou não, isto ou aquilo... claro... respondeu, o que em princípio qualquer outra mãe responderia. -Ó filho, eu acho melhor tu vires a ser polícia. Não pondo sequer a hipótese de sugerir outras alternativas... achou piada à pergunta, contou à noite ao marido e esqueceu o assunto. E foi assim, que com inocente e inconsciente leviandade, marcou o carácter do filho para sempre, sem lhe passar pela cabeça, as voltas que a vida pode dar e quanta ironia o destino nos pode reservar!...

O filho, ao que tudo hoje em dia indica, olhando a coisa à distância, herdara no código genético, a tendência para ladrão, mas, por um complexo de Édipo submerso, nunca se tinha assumido, para não desagradar à mãe. Escolhera optar pela carreira de polícia, numa tentativa velada para a seduzir!
Aguentou viver frustrado uma parte da vida, até ao dia em que os génes gritaram mais alto que a razão e, perante a necessidade de internar a mãe, velha e doente, num "lar" "decente", se viu envolvido, num processo de corrupção.

Hoje, ladrão assumido, vive liberto preso, com a certeza de ter feito o seu melhor, feliz, entre gente que o compreende. A mãe, em consequência deste acontecimento, vive hoje na dispensa de uma tia afastada que tem vivido na miséria e a quem, a pequena pensão que a sobrinha aufere lhe faz um jeitão. Para além de física e materialmente estar impossibilitada de visitar o filho, vive amargurada, sem conseguir libertar-se do complexo de culpa, por ter dado aquele conselho ao filho e angustiada, com a dúvida, de se não teria sido melhor tê-lo aconselhado, a ser ladrão!

Conclusão: Se amar verdadeiramente a sua mãe e possa existir a probabilidade de ela um dia, poder vir a precisar da sua ajuda para ser admitida num "lar" "decente"... se a sua sensibilidade lho permitir e você sentir, desde sempre, vocação para ladrão... prepare-se para a vida... e nunca escolha ser polícia!

domingo, janeiro 16, 2005

Domingo, Janeiro 16, 2005

Apelo para a Humanidade

Tivemos a tristeza de ver recentemente o Tsunami, causando uma grande destruição e vitimando um número inconcebível de pessoas em sete países da Ásia. Sabemos que esse tipo de facto é um acontecimento natural, porém havemos de analisar e acrescentar que a intensidade desse tsunami mostra-nos claramente que o desequilíbrio ambiental é, incontestavelmente, potencializador de forças naturais deste porte. Cabe a nós, definitivamente, uma reflexão séria sobre o assunto e buscarmos maneiras mais correctas de lidarmos com o espaço que vivemos, para que não sejamos nós os responsáveis por catástrofes desta natureza.

Nós blogueiros, propomos desde já, unirmo-nos em um alerta para a humanidade, e implantarmos cada um de nós, a nosso modo e em nosso ambiente, medidas práticas de mudanças!

É tempo de se falar abertamente. É tempo de se abordarem as questões em profundidade e não de forma restritiva. É tempo enfim, de se falar a sério sobre a questão ambiental e ecológica. Sobre a humanidade!

E com razão. É que cada vez mais se toma consciência de que o combate pela preservação, não tem fronteiras, não é regionalizável e de que a resposta ou é global ou não será resposta.

As chuvas ácidas, o efeito de estufa, a poluição dos rios e dos mares, a destruição das florestas, não têm azimute nem pátria, nem região. Ou se combatem a nível global ou ninguém se exime dos seus efeitos.

As pessoas ainda respiram. Mas por quanto tempo?

Os desertos ainda deixam que reverdejem alguns espaços estuantes de vida. Mas vão avançando sempre.

Ainda há manchas florestais não decepadas nem ardidas. Mas é cada vez mais grave o deficit florestal.

Ainda há saldos de crude por extrair, de urânio e cobre por desenterrar, de carvão e ferro para alimentar as grandes metalurgias do mundo. Mas à custa de sucessivas reduções de reservas naturais não renováveis.

Na sua singeleza, o caso é este:

Até agora temos assistido a um modelo de desenvolvimento que resolve as suas crises crescendo cada vez mais. Só que quanto mais se consome, mais apelo se faz à delapidação de recursos naturais finitos e não renováveis, o que vale por dizer que não é essa uma solução durável, mas ela mesma finita em si e no tempo que dura. Por outras palavras: é ela mesmo uma solução a prazo.

Significa isto que, ou arrepiamos caminho, ou a vida sobre a terra está condenada a durar apenas o que durar o consumo dos recursos naturais de que depende.

Não nos iludamos. A ciência não contém todas as respostas. Antes é portadora das mais dramáticas apreensões.

O que há de novo e preocupante nos dias de hoje, é um modelo de desenvolvimento meramente crescimentista – pior do que isso, cegamente crescimentista – que gasta o capital finito de preciosos recursos naturais não renováveis, que de relativamente escassos tendem a sê-lo absolutamente. E se podemos continuar a viver sem urânio, sem ferro, sem carvão e sem petróleo, não subsistiremos sem ar e sem água, para não ir além dos exemplos mais frisantes.

Daí a necessidade absoluta de uma resposta global. Tão só esta necessidade de globalização das respostas, dá-nos a real dimensão do problema e a medida das dificuldades das soluções. Lêem-se o Tratado de Roma, O Acto Único Europeu e mais recentemente as conclusões da Conferência de Quioto, do Rio de Janeiro e Joanesburgo, onde ficou bem patente a relutância dos países mais industrializados, particularmente dos Estados Unidos, em aceitar a redução do nível de emissões. Regista-se a falta de empenhamento ecológico e ambiental das comunidades internacionais e dos respectivos governos, que persistem nas teses neoliberais onde uma economia cega desumanizada e sem rosto acabará por nos conduzir para um beco sem saída.

Por outro lado todos temos sido incapazes de uma visão mais ampla e intemporal. Se houver ar puro até ao fim dos nossos dias, quem vier depois que se cuide!... e continuamos alegremente a esbanjar a água do cantil.

Será que o empresário que projectou a fábrica está psicológica ou culturalmente preparado para aceitar sem sofismas nem reservas as conclusões de uma avaliação séria do respectivo impacto ambiental?
Mesmo sem sacrificar os padrões de crescimento perverso a que temos ligados os nossos hábitos, há medidas a tomar que não se tomam, como por exemplo:

  • Levar até ao limite do seu relativo potencial o uso da energia solar e da energia eólica.
  • Levar até ao limite a preferência da energia hidráulica sobre a energia térmica.
  • Regressar à preferência dos adubos orgânicos sobre os adubos químicos.
  • Corrigir o excessivo uso dos pesticidas.
  • Travar enquanto é tempo a fúria do descartável, da embalagem de plástico, dos artigos de intencional duração.
  • Regressar ao domínio do transporte ferroviário sobre o rodoviário.
  • Repensar a dimensão irracional do transporte urbano em geral e do automóvel em particular.
  • Repensar, aliás, a loucura em que se está tornando o próprio fenómeno do urbanismo.
  • Reformular a concepção das cidades e das orlas costeiras


  • Dito de outro modo: a moda política tende a ser, um constante apelo às terapêuticas de crescimento pelo crescimento. È tarde demais para desconhecermos que, quando a produção cresce, as reservas naturais diminuem.

    Há porém um fenómeno que nem sempre se associa ás preocupações da humanidade. Refiro-me à explosão demográfica.

    Com mais ou menos rigor matemático, é sabido que a população cresce em progressão geométrica e os alimentos em progressão aritmética. Assim, em menos de meio século, a população do globo cresceu duas vezes e meia !...
    Nos últimos dez anos, crescemos mil milhões!... Sem grande esforço mental, compreendemos aonde nos levará esta situação.

    Se é de um homem mais sensato e responsável que se precisa, um homem que olhe amorosamente para este belo planeta que recebeu em excelentes condições de conservação e está metodicamente destruindo; de um homem que jure a si mesmo em cadeia com os seus semelhantes, fazer o que for preciso para que o ar permaneça respirável, que a água seja instrumento de vida e dela portadora, e os equilíbrios naturais retomem o ciclo da auto sustentação, empenhemo-nos desde já nessa tarefa, com persistência e determinação.

    Se é a continuação da vida sobre a terra que está em causa, e em segunda linha a qualidade de vida, para quê perder mais tempo?...

    Por isso apelamos a todos quantos se queiram associar a este movimento pela preservação Natureza, pela Paz e pelo desenvolvimento harmonioso da Humanidade, para subscreverem este Apelo.

    Ao fazê-lo estamos a afirmar a nossa cidadania, enquanto pessoas livres, que olham com preocupação o futuro da Humanidade, o futuro dos nossos filhos!

    Tudo está explicado em Fraternidade